quarta-feira, 29 de outubro de 2008

29 de Outubro de 2008

A Reserva Federal reduziu pela 9ª vez desde 17 de Agosto de 2007 a sua princicpal taxa de referência a taxa de referência. Desta vez a redução foi de 50 pontos base (em linha com as expectativas) fixando a taxa em 1%. No actual estado dos mercados monetário e de crédito os mecanismos de transmissão monetária estão de algum modo comprometidos pelo que é duvidoso que esta redução tenha um impacto significativo mas não deixa de ter um significado psicológico importante.

Entretanto, em mais uma medida excepcional, o FMI divulgou a criação de uma linha de crédito de auxílio às economias emergentes para fazer face a "problemas temporários de liquidez".

Foram hoje divulgados os números das economendas de bens duradouros de Setembro que surpreendentemente apontam para uma ligeira recuperação das encomendas face aos valores francamente maus de Agosto (que foram revistos em baixo) e para uma continuação da deterioração do investimento (excepto aeronaves).

Hungria recebe pacote de ajuda

A Hungria obteve um empréstimo de 20 mil milhões de euros (12,5 mil milhões do FMI, 6,5 mil milhões da União Europeia e mil milhões do Banco Mundial). Esta intervenção segue-se aos apoios do FMI à Ucrânia (16,5 mil milhões de dolares) e à Islândia (2,1 mil milhões de dólares). Além disso o FMI está presentemente em negociações com o Paquistão e a Bielo-Rússia.
No site do FMI informa-se que esta instituição dispõe actualmente de 200 mil milhões de dólares disponíveis para apoiar os países em dificuldades devido à crise financeira. A este ritmo resta saber se serão suficientes ou se será necessário "ajudar" o FMI.

A empresa mais "valiosa" do mundo

A Volkswagen era um dos títulos em que havia mais posições curtas, por duas razões: 1) arbitragem entre as acções ordinárias e acções preferenciais e 2) especulação na descida das acções dos construtores de automóveis devido à expectativa dos impactos da recessão económica. Sucedeu entretanto que a Porsche que se esperava que viesse a adquirir uma posição superior a 50% anunciou que tinha acções e opções correspondentes a quase 75% do capital da empresa. Como 20% do capital é detido pelo Estado da Bavária isso significa que haveria pouco mais de 5% de acções disponíveis (na verdade menos porque algumas serão detidas por index tracking funds) e o mercado foi surpreendido com a escassez de acções para liquidar as posições curtas existentes levando a uma subida da cotação para níveis astronómicos, transformando temporariamente na empresa mais valiosa do mundo em termos de capitalização bolsista e distorcendo a evolução dos índices em que está incluida nomeadamente o DAX (no qual a Volkswagen representava ontem mais de 25%) e o DJEurostoxx.

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

Nikkei no nível mais baixo desde 1982

Tudo aponta para que a Reserva Federal anuncie quarta-feira uma redução da taxa de juro de, pelo menos, 50 pontos base e o presidente do BCE afirmou hoje que "I consider possible that the Governing Council would decrease interest rates once again at its next meeting on the 6th of November", o que corresponde a uma (quase-)garantia de que o BCE irá descer a sua taxa de referência.

O Nikkei caiu mais 6,3% atingido o nível mais baixo dos últimos 26 anos e o iene prosseguiu a sua escalada face ao dólar e, sobretudo, face ao euro enquanto se agravam as dificuldades no Leste Europeu onde o FMI anunciou um empréstimo de 16,5 mil milhões de dólares à Ucrânia e está em negociações com a Hungria ao mesmo tempo que a Standard e Poor reviu em baixa os ratings da Letónia, Lituânia e Roménia.

Nos EUA as vendas de casas novas em Setembro foram inferiores em 33% às verificadas no ano anterior. Verificando-se todavia uma ligeira melhoria face a Agosto e uma redução do stock de casas novas no mercado.

sexta-feira, 24 de outubro de 2008

Crise cambial

Um aspecto surpreendente desta crise é a velocidade com que ela se vai transformando. As notícias destes dias são definitivamente as economias emergentes e a evolução do mercado cambial. Leio rapidamente os jornais económicos e as notícias de subida das taxas de juro na Dinamarca (0,5 pp) depois da Hungria (3 pp) conjugado com a subida extraoridnária do iene, a queda extraordinariamente rápida do euro e o quase colapso cambial noutros países e temo com a ideia de que existe uma elevada probabilidade de muitas instituições financeiras e hedge funds serem severamente afectados.

quinta-feira, 23 de outubro de 2008

Genial

Não percam este vídeo do Daily Show:
http://video.yahoo.com/watch/3725299/10238971

A história destes dois dias tem sido a valorização do dólar que parece ser movida por três factores:
1) a desalavancagem;
2) a melhoria da balança comercial americana devido à queda do preço do petróleo e à redução das importações em consequência da recessão;
3) a percepção de que a recessão / redução do crescimento fora dos EU vai ser mais grave e prolongada do que tinha sido previsto.

quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Spill-over effects

Estou em Bruxelas, onde basta um pequeno passeio para nos cruzarmos com "nomes" com ressonâncias à actual crise financeira (Fortis, Dexia, BNP, ...). Talvez por isso noto, confesso que com alguma surpresa, que o "ambiente" entre os meus colegas de outros países europeus é francamente pessimista, mesmo quase depressivo. Há obviamente quem tente brincar com a situação mas a reacção são alguns risos que não conseguem esconder algum nervosismo.

Segundo o FT (a minha principal fonte de informação diária quando estou no estrangeiro) o crescimento na China caiu para 9% no 3.º trimestre, enquanto na Índia o primeiro ministro indicou que o crescimento iria cair para 7-7,5%. Taxas ainda assim elevadas mas que indicam um arrefecimento acentuado, colocando em causa as expectativas (optimistas) de que o crescimento nas economias emergentes possa amortecer os efeitos da recessão nos EUA e na Europa. Entretanto, o FT tem publicado nestes últimos dias artigos que referem dois problemas que podem assumir proporções graves:
- as dificuldades no crédito à exportação, nomeadamente na Ásia e no Brasil;
- os elevados níveis de exposição ao risco cambial do sector privado em algumas economias emergentes.

Entretanto, nos EUA já se fala da necessidade de um estímulo fiscal de 150 mil milhões de euros. E na Europa seguem os anúncios de apoios financeiros na França (injecção de 10,5 mil milhões de euros nos seis maiores bancos), Finlândia (50 mil milhões de euros) e Suécia (150 mil milhões de euros), com a particularidade que neste caso uma das justificações parece ter sido os receios de perdas devido à exposição dos bancos suecos nos países bálticos.

Acedo à internet e numa olhadela pela Bloomberg leio a notícia de que a Argentina se prepara para nacionalizar os fundos de pensões.

sábado, 18 de outubro de 2008

Ainda sobre o OE para 2009

Percorrendo as medidas fiscais a única medida fiscal com impacto negativo significativo na receita fiscal será a redução de taxa do IRC através da criação de um escalão até 12.500 euros em que será aplicada uma taxa de 12,5%, o que se traduz numa poupança máxima de 1562,5 euros por empresa (o que utilizado as estatísticas do IRC para 2006 divulgadas pela DGCI corresponderá a uma redução de receita de 200-250 milhões de euros) e que apenas terá efeitos no final de 2009 - através do pagamento por conta - ou em 2010 - aquando da autoliquidação. Mas mais, como vai haver um aumento dos pagamentos por conta das empresas com volume de negócios superior a 500 mil euros, ora como são estas que pagam impostos isso significa que com esta medida o Governo deverá encaixar em 2009 pelo menos mais 150 milhões de euros (o que, diga-se de passagem, irá afectar a autoliquidação de 2010 prejudicando a receita desse ano). Na verdade a única medida de redução efectiva de carga fiscal do Governo em 2009 é a que resulta da decisão muito discutível de baixar a taxa do IVA de 21% para 20% que este ano apenas afectou a receita do 2º semestre mas que, no próximo ano, vai afectar a receita dos 12 meses (o que torna a previsão do IVA bastante mais optimista do que aparenta).
Do lado da despesa temos (na óptica da contabilidade nacional - pag 119 do Relatório) um aumento da despesa total de 3,0% (em linha com o crescimento do PIB nominal previsto) mas se repararmos a despesa com juros aumenta 14,4% (de 5.048 para 5.776 milhões de euros) pelo que a despesa primária apenas aumenta cerca de 2,2% (abaixo da taxa de inflação prevista). Ressalta, no entanto, uma coisa estranha que é a redução das despesas com pessoal superior a 12% (-2.591 milhões de euros). Através do jornal Público percebemos que tal se deve a uma alteração "contabilística" relacionada com o registo da contribuição financeira para a Caixa Geral de Aposentações (ou seja com o pagamento das pensões dos funcionários públicos). Então, corrigindo o valor das despesas com pessoal aplicando uma taxa de crescimento de 2,9% às despesas com pessoal em 2008 (o que corresponde a um aumento de 3.208 milhões de euros face ao valor constante do OE) e o aumento da despesa primária sobe para 6,6%.
Então onde é que a despesa aumenta ? Basicamente em duas rubricas: i) despesas de capital (1.358 milhões de euros +28,5%) e ii) prestações sociais (2.686 milhões de euros +8,2%), o elenco das aplicações desse aumento consta da pág. 7 e inclui o reforço do rendimento social de reinserção, a melhoria da retribuição mínima mensal e o complemento solidário para idosos (que será alargado a todos os idosos com mais de 65 anos e se afirma contribuir para um aumento do rendimento médio anual destes superior a 1.000 euros).
Ok. Mas se assim é e o excedente primário aumenta (de 1.352 para 1.926 milhões de euros - o que conjuntamente com o efeito do crescimento do PIB permite compensar a subida da despesa com juros) de onde surgem as receitas? E o segredo está nas contribuições sociais que no OE se prevê que se reduzam 1.684 milhões de euros mas que, considerando o efeito da alteração "contabilística", se verifica que afinal aumentam cerca de 7,8% (?), valor que salvo se verifique um aumento das taxas efectivas das contribuições sociais é francamente irrealista. Sem esse aumento, considerando uma taxa de crescimento dos salários de 3% e uma do emprego de 0,4% (estimativa do cenário macroeconómico do OE) a previsão de receita fica cerca de 800 milhões abaixo da orçamentada e o défice global aumenta para cerca de 2,7% do PIB.

sexta-feira, 17 de outubro de 2008

Grandes projectos de investimento público

O Prof. Campos e Cunha escreveu hoje (mais) um bom artigo, no qual faz uma, quanto a mim, excelente análise da questão dos grandes projectos de investimento público, recordando que o investimento (público ou privado) apenas é desejável "se e só se for socialmente rentável" e insistindo na indispensabilidade de se (re)fazer uma análise social de custo-benefício e frisando o efeito perverso sobre os custos de financiamento do recurso às ditas Parcerias Público Privadas. E convém não esquecer que foi Ministro das Finanças deste Governo pelo que creio que saiba do que está a falar quando refere que "Em muitos casos essa análise de custo-benefício nem é para refazer mas para fazer pela primeira vez".

Este artigo é ainda interessante pela razão que chama a atenção para a diferença entre o PIB e o Rendimento Nacional Bruto que é algo que é ignorado pelo público em geral e muitas vezes esquecido pelos próprios economistas.

Construção de habitação e confiança dos consumidores descem nos EUA

O indicador de confiança dos consumidores divulgado pela Universidade de Michigan desceu de 70,3, em Setembro, para 57,5 em Outubro.
Enquanto isso as licenças de construção para habitação foram em Setembro 38,5% inferiores às concedidas 12 meses atrás e o número de casas começadas a construir está a cair em termos homológos 31,1% (valor que sobe para 41,1% quando consideramos apenas as casas unifamiliares). Relativamente aos dados de construção é de salientar que os números hoje divulgados confirmam a tendência de agravamento da taxa de redução de actividade que já se tinha registado em Agosto e, por outro lado, que se verificou um aumento do número de unidades concluídas face ao mês anterior.
Em qualquer dos casos os níveis divulgados estão abaixo dos que se verificaram na recessão de 1990-1991.

PS: Apesar de ainda muito altas (por exemplo, a Euribor a 3 meses está nos 5,05% quando normalmente deveria estar próximo dos 3,75%) as taxas de juro do mercado interbancário continuaram hoje a descer.

quinta-feira, 16 de outubro de 2008

16 de Outubro de 2008

Nos EUA o indice de preços no consumidor manteve-se em Setembro inalterado face ao mês anterior, enquanto que a Reserva Federal revelou que a produção industrial caiu 2,8% enquanto que um inquérito aos construtores (www.nahb.org/hmi) aponta para a continuação da deterioração nesse sector.

Entretanto, a Suíça anunciou a injecção de 59 mil milhões de dólares no banco UBS. O BCE concedeu um empréstimo de 5 mil milhões de euros ao Banco Central da Hungria e foi anunciado que a Ucrânia está a negociar com o FMI um empréstimo de 10 a 15 mil milhões de dólares.

Em Nova Iorque continua a montanha russa das cotações com o Dow a registar uma diferença entre o máximo e mínimo superior a 800 pontos (!) mas a fechar com uma subida de 4,7%.

PS: O Brent fechou nos 70 dólares !

Sessão de formação do Magalhães

No seu blog Paulo de Carvalho publica um artigo em que descreve uma acção de formação relacionada com o computador Magalhães (http://paulocarvalhotecnologias.wordpress.com/2008/09/29/deformacao-%c2%abmagalhaes%c2%bb/) que se for um retrato fiel do que se passou é quase surrelista.

Notícias dos EUA

Os valores das vendas a retalho hoje publicados apontam para uma quebra de 1,2% em Setembro face ao mês anterior (em Agosto a quebra foi de 0,4% face a Julho). E o famoso Beige Book (http://www.federalreserve.gov/FOMC/BeigeBook/2008/Default.htm) hoje divulgado indica que "economic activity weakened in September across all twelve Federal Reserve Districts. Several Districts also noted that their contacts had become more pessimistic about the economic outlook. Consumer spending decreased in most Districts, with declines reported in retailing, auto sales and tourism. Nearly all Districts commenting on nonfinancial service industries noted reduced activity. Manufacturing slowed in most Districts. Residential real estate markets remained weak, and commercial real estate activity slowed in many Districts. Credit conditions were characterized as being tight across the twelve Districts, with several reporting reduced credit availability for both financial and nonfinancial institutions. District reports on agriculture and natural resources were mostly positive, although adverse weather associated with hurricanes Ike and Gustav negatively affected the South and the Midwest."

Entretanto, os bancos JPMorgan e Wells Fargo deram indicações de que se está já a assistir a uma deterioração significativa do crédito ao consumo (http://www.bloomberg.com/) e surgiram notícias de que alguns hedge funds estariam numa posição complicada (http://www.cnbc.com/id/27204824).

Isto num dia em que o presidente da Reserva Federal afirmou que "Stabilization of the financial markets is a critical first step, but even if they stabilize as we hope they will, broader economic recovery will not happen right away. Economic activity had been decelerating even before the recent intensification of the crisis. The housing market continues to be a primary source of weakness in the real economy as well as in the financial markets, and we have seen marked slowdowns in consumer spending, business investment, and the labor market. Credit markets will take some time to unfreeze. And with the economies of our trading partners slowing, our export sales, which have been a source of strength, very probably will slow as well. These restraining influences on economic activity, however, will be offset somewhat by the favorable effects of lower prices for oil and other commodities on household purchasing power. Ultimately, the trajectory of economic activity beyond the next few quarters will depend greatly on the extent to which financial and credit markets return to more normal functioning." (meu sublinhado). E noutra conferência o Vice-Presidente da Reserva federal Donald Kohn referiu "the most probable scenario as one in which the performance of the economy remains subpar well into next year and then gradually improves in late 2009 and 2010".

Perante estas notícias o S&P 500 caiu 9%. E, apesar disso, os yields de obrigações a 10 anos caíram apenas muito ligeiramente (http://finance.yahoo.com/q?s=%5ETNX).

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Orçamento do Estado para 2009

O exercício de definição do cenário macroeconómico para o OE é sempre um exercício com elevada componente política, é natural que o Governo procure fomentar um clima de confiança que, para ser eficaz, tem simultaneamente de ser credível. É pois de esperar que o cenário se enda a situar próximo (ou até ligeiramente acima) do limite máximo dos intervalos de confiança. E neste aspecto acho que se pode considerar que o cenário do OE para 2009 cumpre.
Se relativamente à taxa de inflação me parece que a estimativa de 2,5% será realista - sendo até possível que se venha a situar abaixo deste valor (saliente-se a este propósito que se baseia num preço do barril de petróleo de 97,3 USD) - a estimativa de 0,6% para o crescimento do PIB é claramente optimista, baseando-se num contributo da procura interna (+0,9%) sustentado pelo consumo privado (+0,8%) e no investimento (+1,5%), ora se a estimativa para o consumo privado sendo optimista não será irrealizável já duvido que haja condições para que as expectativas de crescimento do investimento se venham a materializar.
Mas onde me parece que o cenário é francamente optimista é quanto à evolução do mercado de trabalho, uma vez que, infelizmente, quer a evolução do emprego (+0,4%) quer o nível de taxa de desemprego (7,6%) me parecem irrealistas face ao crescimento esperado.

Ainda quanto ao OE devo confessar que estranho os comentários de que se trata de um orçamento expansionista. Francamente não vejo como é que um orçamento em que o consumo público (+0,2%) cresce abaixo do PIB e em que com um crescimento de 0,6% (portanto, pelo menos espera-se abaixo da taxa de crescimento potencial) se prevê que o nível do défice se mantenha inalteraldo (-2,2% do PIB) pode ser considerado como expansionista ou sequer neutral. Importa não esquecer que perante a desaceleração do crescimento económico os estabilizadores automáticos tenderiam a provocar um aumento do défice pelo que estamos perante um orçamento contraccionista. Seria desejável que fosse de outro modo ? Se olharmos apenas para a taxa de crescimento económico e o desemprego a resposta tenderia a ser sim, mas se recordarmos os níveis do défice da balança corrente (-9,5% do PIB em 2007) parece-me que se justifica esta opção.

Isto como é óbvio significa que a política fiscal não é (nem podia ser) tão favorável às famílias e empresas como parece que se pretende fazer crer. Com efeito, uma leitura rápida do relatório do OE permite descobrir que a taxa de crescimento do IRS (+0,4% o que seria claramente abaixo do cresimento esperado do crescimento dos rendimentos nominais) aumenta para cerca de 4,7% (portanto, aproximadamente em linha com o crescimento dos rendimentos nominais) quando se considera o efeito da participação variável dos municípios no IRS (pag 145 do Relatório) e relativamente ao IRC descobrimos (pag 146) que a redução prevista da receita (-0,9%) "contribui essencialmente a esperada diminuição da autoliquidação das empresas a efectuar em 2009" (ou seja, traduzindo, a redução dos lucros relativos ao exercício de 2008). Estamos, pois, perante um orçamento que no que aos impostos directos diz respeito é, fundamentalmente, um orçamento neutral (que não aumenta nem reduz esses impostos).

terça-feira, 14 de outubro de 2008

Yields das obrigações sobem

Os yields das obrigações do tesouro aumentaram hoje significativamente reflectindo por um lado a redução dos riscos de depressão económica (o que é positivo) mas também as preocupações como o aumento da dívida pública e os riscos de inflação a prazo (o que não é positivo). É ainda demasiado cedo para tirar conclusões sobre qual destes aspectos é o mais importante, mas é um mercado a seguir com atenção.

Esta semana vão sair alguns dados macroeconómicos usualmente bastante importantes (taxa de inflação, vendas a retalho, produção industrial, housing starts e confiança dos consumidores). A relevância destes indicadores é de certo modo relativizada pela evolução frenética da situação mas de qualquer forma permitirão formar uma ideia mais precisa da situação da economia dos EUA antes do climax da crise financeira.

Não resisto a citar o seguinte trecho da declaração conjunta do Tesouro, Reserva Federal e FDIC: "We are pleased to announce that nine major financial institutions have already agreed to participate in both the capital purchase program and the FDIC guarantee program. We appreciate that these healthy institutions (?) are taking these steps to strengthen their own positions and to enhance the overall performance of the U.S. economy." (Sem comentários.)

Entretanto Macro-Man fez uma lista das maiores variações diárias do DJIA e do S&P500 (http://macro-man.blogspot.com/) que mostra que nos últimos 90 anos o nível de variações que temos assistido só tem precedentes em 1929-1933 e 1987.

PS: Apenas como curiosidade o principal indice da Islândia que reabriu hoje caíu 77,4%.

Não é caso para euforias

O S&P500 subiu ontem 11,6% (fechou acima dos 1000 pontos) e está a subir nos mercados de futuros.

Depois de ontem o Reino Unido ter adquirido posições no Royal Bank of Soctland, HBOS e no Lloyds (o Barclays anunciou que pretende um aumento de capital de 6,5 mil milhões de libras mas espera consegui-lo fazer no mercado), a Bloomberg noticia que os EUA poderão "investir" 125 mil milhões de dolares na aquisição de participações no Citigroup, Goldman Sachs, Wells Frago, JP Morgan, Bank of America, Merrill Lynch, Morgan Stanley, State Street e no Mellon e que o Fortis vai receber 14,4 mil milhões de euros da "venda" de activos aos Governos da Bélgica e da Holanda e ao BNP.

As medidas tomadas são um claro sinal de que os Governos estão dispostos a tudo para evitar o colapso do sistema financeiro, mas os problemas estruturais continuam por resolver (as perspectivas de crescimento na Europa e no EUA não melhoraram milagrosamente em virtude destas medidas). Além disso, não é ainda claro o impacto destas medidas no mercado de crédito. E, finalmente, será preciso ter atenção aos efeitos secundários das medidas tomadas nomeadamente nas contas públicas o que terá reflexos nos yields da dívida pública. O pior cenário está afastado mas continuamos num quadro de elevada incerteza que não deixa margens para euforias.

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Sinais positivos

Os bancos centrais estão a ceder uma quantidade ilimitada (!) de dólares no mercado e o Reino Unido injectou 64 mil milhões de dólares em três grandes bancos (http://www.cnbc.com/id/27153245).

A reacção dos mercados está a ser bastante positiva às medidas tomadas e os futuros dos mercados americanos estão bastante positivos mas mais importante parece que finalmente as taxas do mercado monetário interbancário estão a baixar.

domingo, 12 de outubro de 2008

Declaração da cimeira zona Euro

Os parágrafos fundamentais parecem ser:
1. "Governments would make available for an interim period and on appropriate commercial terms, directly or indirectly, a Government guarantee, insurance, or other similar arrangements of new medium term (up to 5 years) bank senior debt issuance."
2. "to allow financial institutions to continue to ensure the proper financing of the Eurozone economy, each Member State will make available to financial institutions Tier 1 capital, e.g. by acquiring preferred shares or other instruments including non dilutive ones. Price conditions shall take into account the market situation of each involved instution. Governments commit themselves to provide capital when needed in appropriate volume while favouring by all available means the raising of private capital."
São claramente medidas concretas e no sentido correcto. Faltou apenas o anúncio de um fundo europeu. Temos de esperar pelos detalhes dos planos nacionais que irão concretizar este anúncio e por um aumento da clareza em Washington. Vamos provavelmente (continuar a) ter uma grande volatilidade nas acções do sector bancário mas estou moderadamente optimista quanto à reacção dos mercados europeus da zona euro e do Reino Unido quando abrirem amanhã e menos pessimista quanto à evolução do euro. Quanto aos restantes mercados e ao que sucederá no mercado cambial (nomeadamente às moedas dos países emergentes) o melhor é mesmo esperar para ver.

E se "salvar" os bancos não for suficiente ?

(Re)lendo o relatório do FMI (Global Financial Stability Report) notei (pag. 24) que do 1,4 milhões de milhões de dólares de estimativas de perdas "apenas" 725-820 mil milhões (ou seja cerca de 55%) afectam os balanços dos bancos. Do restante, 150-250 mil milhões (ou seja cerca de 14,3% do total) afectam seguradoras, 125-250 mil milhões (13,4%) fundos de pensões, 100-135 mil milhões (8,4%) o Governo dos EUA através da Fannie Mae e Freddie Mac e finalmente 115-225 mil milhões (12,1%) hedge funds e outras instituições, a respeito dos quais Nouriel Roubini refere o seguinte:
"the "shadow banking system” (as defined by the PIMCO folks) or more precisely the “shadow financial system” (as it is composed by non-bank financial institutions) will soon get into serious trouble. This shadow financial system is composed of financial institutions that – like banks – borrow short and in liquid forms and lend or invest long in more illiquid assets. This system includes: SIVs, conduits, money market funds, monolines, investment banks, hedge funds and other non-bank financial institutions. All these institutions are subject to market risk, credit risk (given their risky investments) and especially liquidity/rollover risk as their short term liquid liabilities can be rolled off easily while their assets are more long term and illiquid. Unlike banks these non-bank financial institutions don’t have direct or indirect access to the central bank’s lender of last resort support as they are not depository institutions. Thus, in the case of financial distress and/or illiquidity they may go bankrupt because of both insolvency and/or lack of liquidity and inability to roll over or refinance their short term liabilities. Deepening problems in the economy and in the financial markets and poor risk managements will lead some of these institutions to go belly up: a few large hedge funds, a few money market funds, the entire SIV system and, possibly, one or two large and systemically important broker dealers. Dealing with the distress of this shadow financial system will be very problematic as this system – stressed by credit and liquidity problems - cannot be directly rescued by the central banks in the way that banks can."

Salvar os nossos empregos e poupanças

É o título de uma pequena publicação (40 páginas) disponível on-line (http://www.voxeu.org/reports/crisis/crisis.pdf) que reune comentários de vários economistas sobre o que deve ser feito. Parece existir um grande consenso em torno de duas grandes ideias:
- recapitalizar os bancos (a maiorira parece preferir que isso seja feito através de acções preferenciais);
- garantir os empréstimos interbancários.

PS: Relativamente à forma de concretizar as garantias do mercados interbancários a maioria - e é essa também a minha posição - parece entender que os países deveriam garantir os empréstimos interbancários contratados pelos seus bancos nacionais (ou seja, garantir os passivos dos seus bancos) o que reduziria o risco dos bancos que lhes emprestassem dinheiro. No entanto, Daniel Gros defende no Vox que seria preferível que cada Estado garantisse os empréstimos interbancários concedidos pelos seus banco (ou seja os activos). Em teoria acho que ambas as soluções poderiam funcionar mas continuo a preferir a garantia dos passivos que na prática corresponde a obrigar os governos utilizando uma expressão inglesa "put their money where they mouth is". Os sistemas de supervisão são nacionais e temos ouvido os vários governos a assegurar que os seus bancos não estão em situação de insolvência o que se for verdade implicaria que a garantia desses passivos não teria custos para os orçamentos nacionais (na prática até poderia ter um efeito positivo na medida em que cobrem algo por essa garantia). Enquanto que garantir os activos apresenta riscos muito mais elevados para os orçamentos pois significa exporem-se ao risco de insolvência dos bancos de outros países. O principal argumento a favor de garantir os activos poderá ser o de que não resolve os problemas dos bancos dos países que não estejam em condições de dar essa garantia (ou em que ela não seja credível). Se isso suceder acho que a solução seria algum mecanismo de auxílio internacional a esses Estados (por exemplo, a criação de linhas de crédito).

Luz ao fundo do túnel ?

O Financial Times (www.ft.com) noticia que a Alemanha está a preparar um plano de 300 mil a 400 mil milhões de euros, em que pelo menos uma parte serviria para recapitalizar os bancos. A ideia parece ser implementar um plano semelhante ao do Reino Unido. É perceptível que nos EUA, Reino Unido e Europa existe um reconhecimento da urgência da situação e da necessidade de ter algo de específico para tranquilizar os mercados antes da sua abertura 2ª feira.

sábado, 11 de outubro de 2008

Blame game ?

De acordo com a Bloomberg o presidente do BCE disse que as medidas para aumentar a liquidez (?) o um membro do conselho do BCE terá dito (http://www.bloomberg.com/apps/news?pid=20601087&sid=amURjxZ_IVzA&refer=home) que os mercados têm de aceitar que estas medidas precisam de tempo para funcionar. Sou capaz de compreender perfeitamente a situação dos banqueiros centrais e ministros de finanças, estão em face de uma situação extremamente complicada para a qual não estavam minimamente preparados. O problema é que: 1) as medidas não estão a funcionar; 2) há cada vez mais sinais de que a situação nos mercados monetário e de crédito está a estrangular a "economia real" e quanto mais essa situação se prolongar maior o impacto sobre a actividade económica e os lucros e portanto menores as valorizações e maiores os riscos de falência (basta ver o que está a suceder com os construtores automóveis americanos).

Update: As contínuas referências a liquidez faz-me ter a impressão de que ainda não perceberam a gravidade da situação. No fundo os banqueiros centrais foram "treinados" para isso, os instrumentos que possuem são dirigidos a controlar a liquidez, tem funcionado no passado e parece que no fundo continuam à espera que acabem por funcionar. É como alguém que sempre se habituou a abrir a que a água corresse quando abria a torneira e tem uma ruptura no cano de abastecimento mas continua a abrir cada vez mais a torneira sempre à espera que a água corra.

Declaração do G7 e do Secretário de Estado Paulson

Para além de carecer de medidas concretas a Declaração do G7 (http://www.treas.gov/press/releases/hp1195.htm): "We agree to:
1. Take decisive action and use all available tools to support systemically important financial institutions and prevent their failure.
2. Take all necessary steps to unfreeze credit and money markets and ensure that banks and other financial institutions have broad access to liquidity and funding.
3. Ensure that our banks and other major financial intermediaries, as needed, can raise capital from public as well as private sources, in sufficient amounts to re-establish confidence and permit them to continue lending to households and businesses.
3. Ensure that our respective national deposit insurance and guarantee programs are robust and consistent so that our retail depositors will continue to have confidence in the safety of their deposits.
4. Take action, where appropriate, to restart the secondary markets for mortgages and other securitized assets. Accurate valuation and transparent disclosure of assets and consistent implementation of high quality accounting standards are necessary. "
Sinceramente soa-me demasiado vaga e dúbia. Parece-me longe daquilo que o mercado exigia.

Na dedclaração do Secretário do Tesouro Paulson (http://www.treas.gov/press/releases/hp1194.htm) "we finalized an aggressive action plan to address the turmoil in global financial markets and the stresses on our financial institutions" mas depois refere "This action plan provides a coherent framework that will direct our individual and collective policy steps to provide liquidity to markets, strengthen financial institutions, protect savers, and enforce investor protections." ou seja parece que se está a referir a uma estratégia enão a medidas concretas.

A outra parte importante é quando ele refere: "We are developing strategies to use the authority to purchase and insure mortgage assets and to purchase equity in financial institutions, as deemed necessary to promote financial market stability. As we develop plans to purchase equity, as in the approach we are taking to broad mortgage asset purchases, we are working to develop a standardized program that is open to a broad array of financial institutions. Such a program would be designed to encourage the raising of new private capital to complement public capital. Consistent with the legislation, any equity the government purchases through a broadly available equity program would be on a non-voting basis, except with respect to the market standard terms to protect our rights as investors." A parte positiva consiste no reconhecimento da necessidade de recapitalização, a parte julgo que menos positiva é que os montantes disponíveis vão ser repartidos com a compra de activos hipotecários e subsiste a esperança de encontrar fundos privados significativos disponíveis o que não me parece particularmente realista e sobretudo, parece afastar a hipótese de uma nacionalização temporária que me parece que seria a solução mais lógica e efectiva.

EUA anunciam plano para recapitalizar o sistema financeiro

O Secretário de Estado do Tesouro dos EUA anunciou que o G-7 acordou um "plano de acção agressivo" (sem no entanto apresentar detalhes) e que os EUA vão injectar capital nos bancos "o mais depressa possível" http://www.cnbc.com/id/15840232?video=885439561&play=1.

Entretanto foi anunciada uma cimeira extraordinária dos chefes de Estado e de governo dos países da zona Euro para "definir em conjunto um plano de acção da zona euro com o Banco Central Europeu (BCE) para enfrentar a crise financeira” (http://economia.publico.clix.pt/noticia.aspx?id=1345638).

sexta-feira, 10 de outubro de 2008

Algumas notas

Hoje tivemos mais uma sessão marcada pela volatilidade com o S&P500 a transaccionar entre um mínimo de 839,8 e um máximo de 936,36 pontos ou seja num intervalo de quase 100 pontos e mais de 10% o que é verdadeiramente impressionante. Apesar de ter contido as perdas fechando com uma queda de "apenas" 1,2% convém não esquecer que esta foi a 8.ª sessão consecutiva de queda e que este mês o S&P500 caiu quase 23% e está 42,5% abaixo do máximo histórico (cotação de fecho) registado em 9-Out-2007 ou seja há um ano.

Entretanto os mercados monetário e de crédito permaneceram bloqueados (a Euribor desceu mas apenas marginalmente, a Libor do dólar subiu) e assistiu-se a um agravamento substancial da situação nos mercados emergentes: Ásia, América Latina e Europa de Leste com um claro aumento da turbulência nos mercados cambiais.

Uma situação a seguir com atenção é o comportamento das obrigações do tesouro americano. Apesar da quebra da bolsa, do aumento dos riscos de recessão e da redução dos riscos de inflação os yields das obrigações a 10 anos aumentaram pela 4.º dia consecutivo, o que pode resultar 1) da crise de liquidez estar a forçar liquidações dos portfolios de obrigações e/ou 2) dos mercados estarem já a antecipar o impacto das intervenções públicas para resgatar os bancos sobre o stock de dívida pública.

Entretanto, as notícias do G-7 e dos EUA indiciam que os políticos estão com sérias dificuldades em definir iniciativas que reanimem o mercado de crédito e não querendo ser pessimista a minha sensação é que a de que hoje a evolução só não foi mais negativa porque o mercado está na expectativa de que surjam essas medidas.

Bolsas afundam e riscos aumentam

Apesar das quedas pronunciadas (http://economia.publico.clix.pt/noticia.aspx?id=1345550) não estamos a assistir a queda descontrolada. Ao contrário do que ocorre noutros países nomeadamente na Rússia no extermo oriente (http://www.bloomberg.com/apps/news?pid=20601095&sid=aIRkZtjYd5FQ&refer=east_europe) na India (http://www.bloomberg.com/apps/news?pid=20601080&sid=anzsQUDoaTqU&refer=news), na Ucrania - onde o governo teve de assumir o controlo do 6.º banco do país e está numa situação muito delicada (http://www.bloomberg.com/apps/news?pid=20601095&sid=aDI2OvZSZBX0&refer=east_europe) e na Hungria (http://www.bloomberg.com/apps/news?pid=20601095&sid=aaHAbx5z5so0&refer=east_europe). Começa a ser evidente que alguns países (para além da Islândia) que provavelmente vão precisar de mais de uma década para superar esta crise e os riscos associados a toda esta turbulência são tremendos. A probabilidade de grandes instituições (bancos, seguradoras ou hedge funds) se defrontarem com uma posição insustentável é muito significativa.

O único ponto positivo é que apesar de se sentir a preocupação, não existe (ou pelo menos não é visível por enquanto) uma situação de pânico na Europa e dadas as proporções das quedas quase que podemos falar numa estranha tranquilidade, diria que predomina um sentimento de impotência e alguma incredulidade.

Update: Acabei agora de me aperceber que o S&P500 já caiu 22% neste mês. Se fechasse neste nível (909 pontos) seria o pior registo mensal desde, pelo menos, 1958 e seria a maior queda em 12 meses desde Setembro de 1974 (por muito pouco pois nesse mes registava-se uma queda anual de 41,4% face aos 41,3% actuais).

quinta-feira, 9 de outubro de 2008

A raiz dos problemas

Numa dia em que, apesar da descida coordenada das taxas de juro por uma dezna de bancos centrais, se assistiu a mais uma sessão negativo nas bolsas europeias http://economia.publico.clix.pt/noticia.aspx?id=1345475 e em que o S&P500 e o Dow cairam mais de 7% e as condições do mercado monetário não revelaram sinais positivos acho que o mais importante é tentarmos compreender o que está por detrás a suceder.

Assumamos um banco típico que financia o seu activo com 95% dívida (parte substancial de curto prazo) e 5% de capitais próprios. E imaginem que uma parte dos seus activos, por exemplo 30%, são créditos hipotecários. Os gestores deste banco acreditavam na máxima de que "Os preços do imobiliário nunca descem". Hoje em dia pode parecer absurdo mas devemos recordar que o Presidente da Reserva Federal Alan Greenspan disse por diversas vezes que "Housing price bubbles presuppose an ability of market participants to trade properties as they speculate about the future. But upon sale of a house, homeowners must move and live elsewhere. This necessity, as well as large transaction costs, are significant impediments to speculative trading and an important restraint on the development of price bubbles. Overall, while local economies may experience significant speculative price imbalances, a national severe price distortion seems most unlikely in the United States, given its size and diversity."
Sucede porém que inesperadamente (pelo menos para esses gestores, para os accionistas do banco e para os seus depositantes e credores) os preços das casas descem 10% e se descobre que os devedores não têm rendimentos (na verdade nunca ninguém se deu sequer ao trabalho de lhes perguntar - o banco tinha aderido à prática de conceder os designados empréstimos NINJA - No Income No job No Asset). Ou seja, os seus activos desvalorizam-se 3% e os capitais próprios passam a corresponder a apenas 2% dos seus activos, o risco de insolvência aumenta e o banco passa a ter dificuldade em obter financiamentos. A solução é obviamente aumentar o capital. Sucede porém que entretanto o mercado imobiliário continua a cair (entre outras razões porque este banco e outros tomaram posse das casas dos incumpridores e colocaram-nas no mercado) e os seus activos voltam a desvalorizar-se colocando o banco numa solução próxima da insolvência e que o banco não consegue reforçar os seus capitais próprios no mercado ficando com um rácio de solvabilidade de, digamos, 2,5%. Naturalmente que os seus credores, nomeadamente outros bancos vão voltar a ter relutância em emprestar-lhe fundos, colocando o banco numa situação de não poder satisfazer os seus compromissos de curto prazo porque não consegue fazer o roll-over da sua dívida. Ou seja, um problema de insolvência transformou-se num problema de liquidez. Os gestores do nosso banco só têm uma saída que é a de "liquidar" os seus activos, pelo que vão reduzir o crédito concedido (desalavancar o seu balanço) de forma a tentar recuperar os seus rácios de solvabilidade e tentar obter o máximo de meios líquidos possíveis para poder fazer face a levantamentos de depositantes e ao reembolso dos passivos que forem vencendo. A questão é que a recuperação do rácio de solvabilidade de 5% teria que reduzir os seus activos (créditos) para metade. Sucede ainda que o nosso banco não é o único nesta situação e portanto todos os bancos tendem a recusar ceder crédito a outros bancos (ou a só fazê-lo por prazos muito curtos e a taxas elevadas) porquanto: 1) têm receio que os bancos a quem emprestarem fundos caiam numa situação de insolvência; 2) pretendem conservar os seus fundos para fazer face a levantamentos de depósitos e rembolsar os passivos que forem vencendo já que sabem que será muito dificil fazer o respectivo roll-over.
O banco centrais podem eliminar a justificação 2) com alguma facilidade, bastando garantir que disponibilizarão a liquidez necessária aos bancos solventes (cumprindo a sua função tradicional de "lender of last resort"). A eliminação da justificação 1) já implica, todavia, uma resposta mais heterodoxa e teoricamente pode ser prosseguida de duas formas: a) trocando os activos "arriscados" por activos seguros por forma a que os outros bancos deixem de ter dúvidas quanto à solvência dos bancos a quem emprestem - é esta basicamente a ideia subjacente ao plano Paulson; b) aumentando os capitais dos bancos por forma a que deixem de subsisitir dúvidas quanto à solvência dos bancos através de injecção de capitais - é isto basicamente que fizeram os belgas e holandeses e o Reino Unido está a tentar fazer.
Note-se que para que a opção a) funcione por si só seria necessário que os activos "arriscados" fossem comprados a um preço que permitam que os rácios dos bancos sejam satisfatórios. Ou seja, que esses activos sejam adquiridos por um preço superior ao (valor implicito) que os mercados lhes atribuem. A ideia do plano Paulson era a de que esses activos estariam a ser subavaliados pelo mercado e portanto seria possível que o Estado os adquirisse por um preço que permitisse simultaneamente assegurar a solvência dos bancos e sem custos para o Estado (na medida em que o Estado poderia recuperar o valor aplicado na aquisição através da venda desses activos quando o seu valor recuperasse ou mantendo-os até à maturidade).
Existem no entanto vários problemas (para além dos montantes colossais envolvidos): 1) a penalização dos accionistas e gestores que tem sido exigida implica que estes tentem fazer tudo para que os respectivos bancos não sejam auxiliados e que portanto tentem resolver por si só os seus próprios problemas contraindo o crédito e mantendo uma posição de liquidez muito forte; 2) na sequência dos problemas os mercados não estão dispostos a aceitar rácios de solvabilidade que se verificavam antes da crise (exigindo rácios superiores) o que implica igualmente cortes de activos; 3) este processo está associado uma destruição de riqueza considerável (redução do valor do imobiliário - que está na raiz do problema) e do valor dos títulos dos bancos agravada pelos efeitos indirectos resultantes dessa quebra no preço de outros activos; 4) a redução do crédito (ou, pelo menos da taxa de crescimento do crédito) e a destruição de riqueza referida é por si só suficiente para provocar uma desaceleração do crescimento (ou até mesmo uma recessão) que agrava a dificuldade de resolver o processo podendo mesmo criar-se um ciclo vicioso; 5) associado a este processo existe a necessidade de reafectação de recursos dentro da economia (nomeadamente dos sectores da construção e financeiro para outros sectores) e reequilíbrios das taxas de poupança-investimento a nível internacional.
Neste contexto, o melhor que se pode esperar é que o processo de ajustamento seja o menos caótico possível e que a recessão seja relativamente benigna.

quarta-feira, 8 de outubro de 2008

Vantagens da crise

Os economistas têm uma capacidade notável para descobrir benefícios mesmo nas piores situações.
No Vox (http://www.voxeu.org/) Esther Duflo considera que a crise pode fazer com que seja mais fácil às empresas de outros sectores atrair as "mentes brilhantes" que antes preferiam trabalhar em Wall Street conduzindo a uma melhor afectação do talento e Nicholas Bloom estima para o próximo ano uma contração do PIB de 3% e um aumento de 3 milhões de desempregados (quer na Europa quer nos EUA) - cenário que considera optimista - mas não deixa de recordar o ponto positivo de que essa recessão contribuirá para um decréscimo substancial das emissões de CO2.

Sinais positivos

Apesar da descida coordenada das taxas de juro, as bolsas americanas fecharam em queda com o S&P500 a descer 1,1% numa sessão que ficou marcada pela volatilidade. Significativamente é a 6 sessão consecutiva de descida cifrando-se em 15,6% a quebra acumulada desde 30-Setembro.

Entretanto, cumpre salientar que me parece que o plano inglês de injecção de capital nos bancos me parece correcto e que nos EUA o Secretário do Tesouro indicou estar a preparar uma intervenção semelhante (http://www.bloomberg.com/apps/news?pid=20601087&sid=aBkx1kVieIqI&refer=home). Ou seja, parece haver uma consciência crescente de que a solução para actual crise terá forçosamente que passar por uma recapitalização dos bancos que o sector privado não está em condições para concretizar e em que, portanto, será indispensável envolver uma intervenção pública significativa.

Pessoalmente estou pois mais optimista do que ontem ou mesmo hoje de manhã. Trata-se, porém, de um optimismo relativo pois embora considere que estão a ser desenvolvidos passos no sentido correcto: 1) Estes são ainda insuficientes, provavelmente os montantes anunciados nos EUA e no Reino Unido não serão suficientes e será necessário que os outros países europeus tomem medidas semelhantes; 2) existe um risco crescente de risco sistémico derivado de dificuldades noutros países (Islândia, América Latina, Ásia) ou, por exemplo, de posições de hedge funds (além da situação da Islância - que era previsível - existem alguns sinais precoupantes como a desvalorização do won da Coreia do Sul e do rand sul-africano que podem indiciar uma alteração qualitativa da actual crise); e, 3) uma recessão nos EUA, Reino Unido e Zona Euro é inevitável e muito provavelmente será relativamente severa.

Actualização: Sobre a Islândia a Bloomberg noticia que "The central bank today ditched a currency peg equivalent to 131 krona per euro after failing to convince investors it could maintain it. That announcement came shortly after the government said it canceled the purchase of a 75 percent stake in Glitner and handed the lender over to regulators, saying it was in bigger trouble than previously estimated. (...) The central bank said yesterday it would try to fix the trade- weighted krona index at 175, corresponding to 131 against the euro. Nordea Bank AB, the biggest Scandinavian lender, said the price suggested by bid/ask spreads in pre-market trading was 255 per euro, 49 percent below the rate targeted by the bank.
(...) The debts of the Icelandic banking system are too big for the government to repay. ``There is no way that the Icelandic population can assume responsibility for the private debt'' the banks have built up, Haarde said."
Sobre a Coreia: "South Korea's won slumped to the lowest in a decade as a seizure in global credit markets forced banks and companies to tap currency exchanges to meet their dollar-financing requirements (...) The won fell as much as 5.1 percent today"
E os sinais do México e Brasil também não são nada tranquilizadores: "Brazil sold dollars for the first time in five years and Mexico offered $2.5 billion in a bid to shore up currencies that have been ravaged by the worst financial crisis since the Great Depression
Central bankers stepped into the foreign exchange market after Mexico's peso tumbled as much as 13.8 percent, its biggest intraday drop since a government devaluation in 1994, and Brazil's real sank as much as 9.4 percent to a three-year low. Both currencies pared losses after policy makers announced the dollar sale plans. (...) The peso close little changed at 12.3225 per dollar after earlier touching a record low of 14.2927. The peso has sunk 20 percent from a six-year high reached Aug. 4. The real fell 1 percent to 2.3342 per dollar, extending its decline this month to 18.4 percent."

Actualização2: E no Paquistão as coisas também não estão bem: "State Bank of Pakistan, the nation's central bank, pumped foreign currency into the market to prop up the rupee, which fell to a record low against the U.S. dollar. (...) Standard & Poor's this week cut the nation's long-term foreign currency rating by two levels to CCC+, a grade that ranks it above only the Seychelles in terms of creditworthiness, and said further reductions may be necessary. (...) Pakistan's foreign-exchange reserves have dropped 67 percent in the past year to about $4.7 billion, while the nation has about $3 billion of debt-servicing costs due in the coming year. Pakistan is the world's riskiest government borrower according to credit-default swap prices from CMA Datavision."

Descida das taxas de juro

Acabou de ser anunciada uma descida coordenada de 50 pontos base (0,5 pontos percentuais) das taxas de juro nos EUA , Zona Euro, Reino Unido, Canadá, Suécia e Suíça (http://economia.publico.clix.pt/noticia.aspx?id=1345312).

Teoricamente deveria ser o suficiente para os mercados recuperarem consideravelmente dos mínimos (dado as quedas dos últimos dias não seria de excluir uma subida de 5-10%) e acalmarem por uns dias mas a reacção inicial dos mercados , embora positiva não está a ser tão entusiástica como se esperaria, talvez porque: i) a descida das taxas no Reino Unido e nos EUA já era antecipada e até, pelo menos no caso do Reino Unido, terá ficado abaixo das expectativas; ii) o ambiente psicológico é bastante negativo e os mercados podem interpretar esta acção como um sinal de desespero.

Irlanda em recessão

O Eurostat divulgou a segunda estimativa para o PIB no 2.º trimestre 2008 que apontam para uma queda de 0,2% na zona euro (idêntico à primeira estimativa) e uma estagnação do PIB na UE 27 (a estimativa anterior era -0,1%). Os dados divulgados confirmam o 2º trimestre consecutivo de queda do PIB na Estónia e Letónia e também na Irlanda. Além destes países verificaram-se quedas do PIB na Alemanha (-0,5%), França e Itália (-0,3%). As estimativas para a Espanha e Reino Unido mantiveram-se nos 0,1% e 0%, respectivamente.

A um passo do abismo ?

O Nikkei caiu 9,4%.

A Islândia está à beira da bancarrota.

As bolsa de Moscovo foi suspensa até dia 10 de Outubro, enquanto que a bolsa de Jacarta foi suspensa "indefenidamente"

Depois da Espanha ter criado um fundo de 30 mil milhões de euros, o Reino Unido anunciou que vai injectar 50 mil milhões de libras no sistema bancário.

Pode parecer muito mas o FMI (http://www.imf.org/external/pubs/ft/survey/so/2008/NEW100708A.htm) estima que "losses on U.S.-based loans and securities may rise to some $1.4 trillion—a significant increase from the estimate of $945 billion in the April 2008 GFSR", conclui que "Financial institutions need to raise more capital - an estimated $ 675 billion (...) Without the ability to obtain new capital from private markets, recapitalization using the public sector balance sheet should now be considered as solvency concerns have led to a seizing up of interbank funding markets" e alerta que a crise está a espalhar-se para os mercados emergentes.

Basta olhar para as bolsas para sentir que o pânico está definitivamente a instalar-se e começa a ser evidente a necessidade de tomar medidas imediatas que evitem o colapso do sistema financeiro. E as medidas mais óbvias são: i) a descida substancial e imediata das taxas de juro de referência na zona Euro, EUA e Reino Unido e ii) nacionalização (através de injecções de capital) de grande parte do sistema bancário.

terça-feira, 7 de outubro de 2008

Papel Comercial

A criação de um fundo para apoiar o papel comercial e as referências ao papel comercial despertaram a minha curiosidade para a dimensão do que estava a acontecer e descobri que nas últimas três semanas (até 1 de Outubro) o volume de papel comercial caiu 215,2 mil milhões de dólares (http://www.federalreserve.gov/releases/cp/outstandings.htm).

Discurso do presidente da Reserva Federal

O presidente da Reserva Federal faz uma excelente análise da situação económica nos EUA (http://www.federalreserve.gov/newsevents/speech/bernanke20081007a.htm):

"Economic activity had shown signs of decelerating even before the recent upsurge in financial-market tensions. As has been the case for some time, the housing market continues to be a primary source of weakness in the real economy as well as in the financial markets. However, the slowdown in economic activity has spread outside the housing sector. Private payrolls have continued to contract, and the declines in employment, together with earlier increases in food and energy prices, have eroded the purchasing power of households. This sluggishness of real incomes, together with tighter credit and declining household wealth, is now showing through more clearly to consumer spending. Indeed, since May, real consumer outlays have contracted significantly. Meanwhile, in the business sector, worsening sales prospects and a heightened sense of uncertainty have begun to weigh more heavily on investment spending as well.

The intensification of financial turmoil and the further impairment of the functioning of credit markets seem likely to increase the restraint on economic activity in the period ahead. Even households with good credit histories are now facing difficulties obtaining mortgage loans or home equity lines of credit. Banks are also reducing credit card limits, and denial rates on automobile loan applications reportedly are rising. Businesses, too, are confronting diminished access to credit. For example, disruptions in the commercial paper market and tightening of bank lending standards have made it more difficult for businesses to obtain the working capital they need to meet everyday operating expenses such as payrolls and inventories.
All told, economic activity is likely to be subdued during the remainder of this year and into next year. The heightened financial turmoil that we have experienced of late may well lengthen the period of weak economic performance and further increase the risks to growth."

Perante este cenário não é de estranhar que as bolsas nos EUA tenham caído mais de 5% com o S&P500 a fechar abaixo dos 1000 pontos. Esta queda acentuou-se na última hora de negociação e depois do fecho tivemos um início da "earnings season" com a Alcoa (um dos componentes do Dow http://www.cnbc.com/id/27071615) a ficar muio abaixo das expectativas (37 centimos por acção contra os 53 esperados), pelo que é de esperar que a Europa abra amanhã em forte baixa.

Finalmente uma nota para as conclusões do Conselho ECOFIN (http://www.ue2008.fr/PFUE/lang/en/accueil/PFUE-10_2008/PFUE-07.10.2008/pid/14239)
que define um conjunto de princípios mais ou menos vagos e genéricos que serão aplicados a nível nacional, sendo de salientar que parece haver uma especial preocupação com os eventuais efeitos adversos das decisões de outros Estados-Membros. Quanto ao resto é do melhor europês com destaque para a conclusão de que "fiscal prudence is necessary to support confidence notably in view of the ageing of the population and to ensure a good mix between fiscal and monetary policy. The 2005 reformed Stability and growth Pact is the adequate framework and should be fully applied. It contains flexibility to allow for fiscal policy to play its normal stabilisation function. In particular, relatively large European automatic stabilisers can help cushion the slowdown, while respecting the 3% of GDP deficit threshold. In countries facing
more severe slowdown and where room for manoeuvre exists, temporary and targeted
measures may be taken, notably towards those most affected by the current economic
situation. They would also have to take into account the specific challenges of the
country concerned, i.a. the need to recover competitiveness." (que é exercício de equilíbrio notável entre a defesa da ortodoxia orçamental e a abertura para políticas orçamentais mais activas).

Entretanto deixo um link para o artigo que Krugman com um modelo sobre os mecanismos de transmissão da actual crise (http://www.princeton.edu/~pkrugman/finmult.pdf). A ler.

E o carrossel continua

Ontem foi um dia de fortes quedas nas bolsas de todo o mundo que acabou por ser um pouco atenuado pela subida dos índices dos EUA na última hora. Pessoalmente considero interessante de a descida ter abrangido todos os sectores quase por igual não se concentrando particularmente no sector financeiro, indicador de que o mercado está (finalmente) a começar a descontar os efeitos da actual crise financeira sobre a economia em geral.
Entretanto a crise financeira continua a fazer vítimas com os bancos britânicos no centro das notícias hoje, surgindo notícias de um "investimento" do Governo Reino Unido de 79 mil milhões de dólares (http://www.cnbc.com/id/27062494).
E os bancos centrais recorrem a todas as armas do arsenal para assistir os mercados e equacionam medidas extraordinárias. A Reserva Federal anunciou ontem (http://www.federalreserve.gov/newsevents/press/monetary/20081006a.htm) que vai passar i) a pagar juros sobre as reservas dos bancos - o que reduz o custo de oportunidade de manter essas reservas mas trata-se sobretudo de medida técnica em virtude da "escassez" de títulos do tesouro para intervir no mercado para que a federal funds rate não desça substancialmente da taxa de referência; ii) aumentar substancialmente a liquidez concedida através dos leilões TAF e iii) autorização para que um banco adquira activos de fundos monetários numa clara tentativa de suportar estes fundos. E no que constituiria um passo (tanto quanto sei) sem precendentes estará a ser equacionado pela Reserva Federal e pelo Tesouro a possibilidade de criar um fundo para adquirir papel comercial (http://www.cnbc.com/id/27060257).
Entretanto o banco central da Austrália anunciou um corte de 1 ponto percentual nas taxas de juro e os mercados imploram por cortes de taxas nos EUA, no Reino Unido e na Europa. E é quase certo que os vão ter, a questão é saber se esses cortes vão surgir nas próximas reuniões ou ainda antes e, sobretudo, se nas actuais condições do mercado monetário e de crédito essas descidas terão impacto sobre a actividade económica (é bom recordar que desde Setembro 2007 a Reserva Federal já reduziu a sua taxa de referência de 5,25% para os 2%).

domingo, 5 de outubro de 2008

Links interessantes

com muitos gráficos sobre a crise no mercado imobiliário americano: http://www.milkeninstitute.org/10022008slides.pdf. Recomendo.

PS: Entretanto, através do seu blog Krugman teve a gentileza de disponibilizar os seus slides sobre uma apresentação que fará amanhã sobre os riscos de contágio http://www.princeton.edu/~pkrugman/contagion.pdf.
E já agora deixo também aqui um link sobre a discussão da regra "mark-to-market" (http://www.rgemonitor.com/globalmacro-monitor/253859/should_mark_to_market_meet_its_maker), que me faz recordar a famosa frase de Churchill de que (cito de memória) "a Democracia é o pior dos regimes à excepção de todos os outros".

PS2: Aqui vai a citação integral: "Many forms of Government have been tried, and will be tried in this world of sin and woe. No one pretends that democracy is perfect or all-wise. Indeed, it has been said that democracy is the worst form of government except all those other forms that have been tried from time to time."

Mais uma "nacionalização" à vista...

O Hypo Bank anunciou que o plano de salvamento, em que o BCE e Bundesbank iriam "contribuir" com 20 mil milhões de euros e um grupo de bancos com 15 mil milhões, falhou porque os bancos participantes decidiram retirar o seu apoio. A dimensão das necessidades de liquidez (?) que poderão ascender a 100 mil milhões de euros (!!!) até ao final de 2009 é impressionante (http://www.bloomberg.com/apps/news?pid=20601087&sid=aTzH1395FM8s).
Entretanto, a declaração de Gordon Brown de "a mensagem principal que deve sair desta reunião (cimeira do G4 europeia) é a de que nenhum banco viável e sólido, deve falir com base numa falta de liquidez" não se me afigura nada tranquilizadora pois é cada vez mais óbvio que estamos perante um problema de solvência do sistema financeiro internacional de que a liquidez é sobretudo um sintoma (http://economia.publico.clix.pt/noticia.aspx?id=1344928).
Igualmente reveladora é a afirmação de Gordon Brown de que “Cada um de nós deverá definir nesta reunião o que se pode fazer para garantir a segurança das empresas dos nossos países" e de Merkel de que "os Estados europeus devem assumir as suas responsabilidades", que aponta para um intervenção Estado a Estado e não europeia. Ou seja tudo indicia que a Europa vai prosseguir com o "modelo Fortis" ou seja trabalhar em conjunto para encontrar uma solução mas cada país vai ter que assumir os custos relativos à intervenção nas suas instituições nacionais. Politicamente, compreende-se que assim seja pois seria certamente dificl convencer os cidadãos-eleitores de outros Estados-Membros a partilhar os custos de uma intervenção nos bancos de outros Estados, mas pode levar a dificuldades e ser fonte de tensões de que a decisão irlandesa de garantir todos os depósitos dos seus bancos, o que obviamente é um incentivo à deslocalização de depósitos (designadamente de grandes instituições como fundos de pensões) de outros bancos para os bancos irlandeses, poderá ter sido um primeiro exemplo.

sábado, 4 de outubro de 2008

Deterioração do emprego nos EUA no mês de Setembro

Apesar da taxa de desemprego se manter nos 6,1% (na verdade subiu de 6,05% para 6,12% ou seja 0,07%) os números do emprego nos EUA foram mais um indicador das dificuldades que a economia americana está a atravessar com uma redução de 159 mil trabalhadores assalariados (o nono mês consecutivo de queda e uma redução de quase 1 milhão de empregos no sector privado desde Novembro de 2007).
A deterioração da situação no mercado de trabalho na medida em que aumenta as dificuldades das famílias para fazer face aos seus compromissos financeiros (numa altura em que a taxa de esforço financeiro se situa em níveis historicamente muito elevados http://www.federalreserve.gov/releases/housedebt/default.htm) tenderá a constituir mais um factor de agravamento situação do sistema financeiro numa altura em que surgiram sinais bastante preocupantes de dificuldades na obtenção de crédito (nomeadamente através da emissão de papel comercial) - ver http://www.economist.com/opinion/displayStory.cfm?source=hptextfeature&story_id=12342237.

quinta-feira, 2 de outubro de 2008

EUA já em recessão ?

Os números das vendas de automóveis em Setembro situaram-se 23,4% abaixo dos registados um ano antes (considerando o período Jan-Set a queda face ao período homólogo é de 12,8%), considerando os dados conhecidos para os meses de Jul e Ago já indicavam uma quebra do consumo superior a 1% bem como os indicadores de produção industrial (-1,6% na média móvel 3 meses - valores anualizados) e construção (-4,8%) não parece muito arriscado apostar uma quebra do PIB neste trimestre.

O custo de oportunidade do Magalhães

Em carta publicada hoje no Público o coordenador adjunto do Plano Tecnológico vem defender que “O Magalhães vale mais do que dúvidas e polémicas estéreis. O Magalhães vale pelo brilho nos olhos das crianças que o recebem e vale pela oportunidade que lhes é dada de acreditar no futuro e construir algo de novo”.
Fico, pois, feliz por saber para o Governo o mais importante é a felicidade das crianças e que não serão questões ou dúvidas sobre a efectividade dos recursos aplicados ou sobre o financiamento do projecto que vão impedir o Governo de garantir essa felicidade e destruir a esperança no futuro.
É óbvio que em vez de se ter optado por “oferecer” portáteis, poder-se-ia ter recorrido ao testado método utilizado pelo Pai Natal de pedir às criancinhas que formulassem uma lista de desejos com base na qual seria oferecidas “prendas” às crianças. Tal teria eventualmente maximizado a felicidade das crianças mas o Governo também quer que as nossas crianças acreditem no futuro e construam “algo de novo”. E sobre como é que o Magalhães vai contribuir para isso, somos elucidados que “a tecnologia, só por si, não é uma varinha mágica para resolver problemas mas é um fortíssimo catalisador de mudança que ajudará à criação de conteúdos e à participação de muito mais portugueses na rede global”. Ou seja, só por si não, mas talvez combinada com outras coisas o Magalhães possa funcionar uma “varinha mágica” (o que não é de estranhar, pois afinal nas histórias de encantar as varinhas mágicas só funciona quando se conhecem as “palavras mágicas” e “mudança”, “esperança” e “catalisador” são, pelo menos, tão boas como outras quaisquer).
É-nos, no entanto, dito, que o projecto “Vale sobretudo porque coloca o computador e a Internet ao alcance de todas as crianças, e não apenas daquelas cujas famílias podem pagar preços de mercado”. Ou seja, existia uma falha de mercado que impedia que todas as crianças tivessem acesso a computador e à Internet que o Governo se apressou a suprir, mas mesmo aceitando que essa falha existia não se explica porque razão se considerou que esta seria a melhor forma de solucionar essa falha (desde logo não se compreende porquê subsidiar o acesso a todos e não apenas aqueles cujas famílias não podiam pagar o preço de mercado.
E muito francamente duvido que tenha sequer existido uma ponderação adequada dos benefícios, pois o que nos é dito é para não nos preocuparmos pois “o Magalhães não surge em vez de outras coisas que faltam ao sistema de ensino”, ou seja procura-se fazer passar a mensagem de que estaríamos perante o caso raro de “um almoço grátis” e, portanto, não nos precisamos de preocupar com minudências como o custo de oportunidade.
A tranquilidade que esta afirmação me introduz é infelizmente contrariada pela de que “Não há memória de um investimento desta ordem, nem há nenhum pais que tenha feito nada parecido”, pois não havendo custos não sei se podemos falar em “investimento” (ou tem custos elevados e implica necessariamente sacrificios noutras áreas - ou dos contribuintes - ou não tem e o investimento é nulo ou insignificante) e fica porque explicar porque os outros países nunca fizeram nada semelhante… a não ser que o Governo tenha descoberto alguma solução milagrosa, caso em que será de esperar que na próxima reunião da União Europeia a divulgue e depressa veremos surgirem programas semelhantes noutros países da Europa.

PS: Entretanto, na carta afirma-se que “Num mundo que muda à velocidade que tem sido bem evidente nas últimas semanas, é preciso agir no sentido correcto e não encontrar desculpas para ficar parado”, ou seja, parece que se pretende utilizar a actual crise financeira como mais um argumento para justificar este projecto. Curioso para dizer o mínimo.

quarta-feira, 1 de outubro de 2008

We Need to Recapitalize the Banks

É o título de um excelente artigo do Edmund Phelps no WSJ que recomendo:
(http://online.wsj.com/article/SB122282719885793047.html) e do qual, para além das dúvidas quanto à eficácia do plano proposto (na linha do que tem vindo a ser dito por Krugman e outros - ver post anterior) e da sugestão de recapitalização dos bancos através de injecção de fundos em troca de warrants. retiro a seguinte frase: «The end of the speculative fever and the credit crunch each have structural effects on the real prices of business assets, real wages, employment and unemployment. As I see it, the former has pushed up the normal, or "natural," volume of structural unemployment. The latter (and the excess houses) is pushing the economy into a temporary slump. It will last as long as required for the banks' self-healing and government therapy to pull us out of it and into the neighborhood of our new, postboom normalcy.»

De Wall Street para Main Street

Sabemos que as coisas estão más quando uma quebra de 15,6% nas vendas é considerado um bom resultado (http://www.cnbc.com/id/26978669/for/cnbc/) e uma empresa com uma capitalização de 245 mil milhões de dólares e rating AAA anuncia "plans to raise $15 billion through stock sales to improve liquidity". As vendas de automóveis são um indicador dos efeitos devastadores que a restrição do crédito pode ter na economia e os planos da GE das dificuldades tremendas que as empresas estão (irão) sentir para refinanciar os seus passivos e continuar a investir. Sinais claros de que a crise já está (e irá) afectar a dita "economia real", a questão que se coloca é se o plano que vier a ser aprovado (continuo convencido que acabará por ser) é suficiente.
Sobre isso tem sido interessante acompanhar o que vai sendo dito por Krugman (http://krugman.blogs.nytimes.com/) e outros que consideram que o verdadeiro problema não é de liquidez mas sim de solvência. E, com efeito, tudo indica que os problemas de liquidez são um sintoma das dúvidas fundadas quanto à solvência das instituições e portanto qualquer solução terá que passar por uma recapitalização dos bancos o que implica que para funcionar o plano tem de implicar a compra de activos acima do seu "valor de mercado" (que pode, ou não, estar exageradamente baixo) por uma margem suficientemente elevada, o que não é certo que o plano permita fazer e é, em grande medida, contraditório com o marketing do plano feito pela administração americana.

Indicador da indústria transmformadora nos EUA (ISM)

situou-se em 43,5 em Setembro contra 49,9 no mês anterior (valores inferiores a 50 indicam uma contração no sector) enquanto que a Ford anunciou que terá tido uma quebra de 34% das vendas de veículos automóveis face ao mesmo mês do ano anterior.

Enquanto nos EUA tentam "salvar o plano de salvamento"

Foi hoje conhecido o indice Case-Shiller relativo ao mês de Julho que revela que, em média, nos últimos 12 meses os preços das casas nas 20 maiores cidades os EUA caíram 16,3%, ajustando do efeito da inflação temos uma queda de 20,7%. Apesar disso os preços reais ainda estão 28,4% acima dos que se verificavam em Jan 2008 o que conjugado com os indicadores relativos ao stock de casas para venda e a situação dos mercados financeiros aponta para uma continuação do processo de "ajustamento" no mercado imobiliário norte-americano.

Entretanto foram ontem divulgados na Europa os indicadores de confiança relativos ao mês de Setemebro que apontam para uma degradação acentuada da situação económica, salientando-se pela negativa a evolução no Reino Unido e em Espanha onde o indicador de sentimento económico estão nos níveis mais baixos desde, respectivamente, 1993 e 1991 o que parece confirmar que estes países estão já em recessão. Nos outros 3 grandes países da União verificou-se uma continuação da degradação da situação na Alemanha e uma ligeira recuperação na França e Itália depois das quebras acentuadas verificadas em Julho e Agosto. De salientar, ainda, que o indicador de confiança da indústria caíu nestes 5 países.

Em Portugal, apesar de ligeira recuperação da confiança dos consumidores (associada a uma apreciação não tão negativa da evolução dos preços) verificou-se uma nova degradação do indicador de sentimento económico com uma redução significativa da confiança na indústria onde se verificou a continuação da degradação das encomendas do exterior.

Entretanto, continuando o esforço notável de melhoria da informação estátística nacional, o INE divulgou hoje pela primeira vez as contas nacionais trimestrais por sector institucional (período 1999Q1 2008Q2) que revelam que a poupança bruta nacional se continua a degradar (11,0% nos últimos 4 trimestres - 2007Q3 a 2008Q2 - quando em 1995 era 20%) muito por "culpa" da evolução da poupança das famílias (6,2% nos últimos 4 trimestres quando em 1995 se situava nos 14,1%). Conjugando os dados agora divulgados com os publicados pelo Banco de Portugal o nível de endividamento das famílias situava-se no final de Junho em cerca de 124% do rendimento disponível (em 1995 este indicador era cerca de 40%).