quinta-feira, 16 de julho de 2009

Os défices salvaram o mundo (por enquanto)

Paul Krugman apresenta um gráfico sugestivo da evolução da poupança privada e do Governo no contexto da actual crise comparando-a com a ocorrida aquando da Grande Depressão e conlcui que: "the initial shock — the surge in desired private surplus — was if anything larger this time than it was in the 1930s. This says that absent the absorbing role of budget deficits, we would have had a full Great Depression experience. What we’re actually having is awful, but not that awful — and it’s all because of the rise in deficits."
De facto o ajustamento da poupança privada nos EUA foi colossal e partilho inteiramente da convicção de que na ausência do "ajustamento" orçamental os efeitos económicos teriam provavelmente sido devastadores. Tenho no entanto alguns comentários:
1. O nível de poupança privada nos EUA era insustentavelmente baixo pelo que de certo modo esse ajustamento era "inevitável".
2. Nos tempos "aureos" esse nível de poupança era "compensado" com o elevado nível de poupança externa (e.g. China, Japão e Alemanha) que se tem vindo a atenuar e que tem sido um das fontes de "transmissão" da crise.
3. Apesar da subida a poupança das famílias nos EUA ainda se encontra em níveis francamente baixos ao mesmo tempo que o défice público está num nível "gigantesco", o que significa a necessidade de continuação do ajustamento externo.

Perspectivas para a economia portuguesa

De acordo com o Banco de Portugal a economia portuguesa deverá contrair-se 3,5% em 2009 e 0,6% em 2010, sendo esta evolução negativa explicada pela evolução do consumo privado (-1,8% em 2009 e -0,6% em 2010) da FBCF (-14,3% e -3,8%) e das exportações (-17,7% e -0,9%). Enquanto que o consumo público deverá crescer (1,0% e 0,7%) e as importações reduzirem-se (-17,1% e -1,2%).
Como seria de esperar neste contexto a evolução prevista do emprego não é nada animadora (-2,6% em 2009 e -1,5% em 2010), que corresponderá a uma destruição de cerca de 200 mil empregos.
Permitam-me, todavia, que destaque o que no Relatório se refere a propósito da balança corrente (págs. 34 e 35): “Após um valor correspondente a 10,5% do PIB em 2008 as actuais projecções contemplam uma diminuição das necessidades de financiamento para 8,3% em 2009 seguida de um aumento para 9,6% em 2010. Esta situação é a contrapartida do desequilíbrio persistente e tendencialmente crescente entre o nível de investimento e poupança que tem caracterizado a economia portuguesa”. E crucialmente acrescenta que “As contínuas necessidades de financiamento externo têm tido como consequência uma deterioração sucessiva da posição de investimento internacional da economia portuguesa e um aumento progressivo do défice da balança de rendimentos (…) que aumentou de 2% do PIB em 2000 para 4,7% do PIB em 2008 [e] deverá continuar a registar um perfil tendencialmente ascendente ao longo do horizonte de previsão (4,8% e 5,7% em 2009 e 2010, respectivamente)”.

sexta-feira, 10 de julho de 2009

Sobre a poupança em Portugal

Na debate político e económico em Portugal muito se tem discutido sobre o investimento e curiosamente pouco tem sido referido sobre a poupança. O que não deixa de ser estranho quando o nível de FBCF em percentagem do PIB, embora tenha vindo a descer não é muito diferente da média da zona euro. De facto nos últimos 4 trimestres (2008q01 a 2009 q01) a FBCF terá representado cerca de 21,1% do PIB enquanto que no conjunto da zona euro esse valor foi de cerca de 21,3%.
É quando olhamos para os números da poupança que verificamos um problema sério. De facto de acordo com os dados do INE nesse mesmo período a poupança bruta não só atingiu um novo mínimo de somente 9,6% como está a cair mais rapidamente que a FBCF e as necessidades de financiamento da economia face ao exterior continuam a exceder 10% do PIB. E isto porque apesar de uma pequena subida da poupança das famílias, nos últimos trimestres verificou-se uma deterioração preocupante da poupança das sociedades não financeiras e das administrações públicas.

quarta-feira, 8 de julho de 2009

Entrevista do Ministro das Finanças

Na passada 6.ª feira o Ministro das Finanças declarou que "Vamos precisar, depois da crise, de corrigir novamente as contas públicas". Curiosamente, esta afirmação parece ter passado quase despercebida. E de facto a afirmação não tem nada de excepcional atendendo ao facto de que é conhecido o desequilíbrio orçamental que se deverá traduzir num défice que de acordo com as previsões reafirmadas pelo Ministro das Finanças se deverá situar nos 5,9% (sendo que a Comissão Europeia e a OCDE apontam para valores mais elevados da ordem dos 6,5%) e num aumento significativo da dívida pública. Mas, não deixa de ser estranho que o tema da forma como esse desequilíbrio será corrigido esteja praticamente ausente do debate político e económico.

sexta-feira, 3 de julho de 2009

ISM e desemprego nos EUA

O indicador de confiança ISM referente ao mês de Junho registou uma subida de 2 pontos (para 44,8), com um resultado particularmente positivo na avaliação da produção actual que subiu 6.5 pontos, excedendo pela primeira vez os 50 pontos (cifrou-se em 52 pontos). Nem tudo foi inteiramente positivo uma vez que se verificou uma queda (-1,9 pontos para 49,2) da componente "novas encomendas".
Entretanto os valores do desemprego ontem divulgados embora apontem para uma subida de "apenas" 0,1 p.p. (para 9,5%) foram uma relativa desilusão na medida em que este valor foi obtido à custa de uma queda de 0,2 pp. na taxa de participação e o emprego continuou a diminuir, tendo-se verificado mesmo um agravamento do número de empregos perdidos que aumentou para 467 mil (no mês anterior foi 322 mil).

quarta-feira, 1 de julho de 2009

O contra-manifesto

Um vasto conjunto de professores universitários, na sua grande maioria economistas, apresentou um manifesto que pretende claramente constituir uma resposta ao manifesto sobre os ditos grandes projectos de investimento recentemente apresentado (manifesto dos 28).
Passando ao lado da demagógica comparação entre os custos das grandes obras públicas e os custos do desemprego, este manifesto considera essencialmente que estamos perante uma crise global de procura e que é necessário “um vigoroso estímulo contracíclico, coordenado à escala europeia e global” assente numa política orçamental expansionista em que “os recursos públicos devem ser prioritariamente canalizados para projectos com impactos favoráveis no emprego, no ambiente e no reforço da coesão territorial e social: reabilitação do parque habitacional, expansão da utilização de energias renováveis, modernização da rede eléctrica, projectos de investimento em infra-estruturas de transporte úteis, com destaque para a rede ferroviária, investimentos na protecção social que combatam a pobreza e promovam a melhoria dos serviços públicos essenciais como saúde, justiça e educação”, os quais “servirão não só para contraria a quebra conjuntural da procura privada, mas também abrirão um caminho para o futuro: melhores infra-estruturas e capacidades humanas, um território mais coeso e competitivo, capaz de suportar iniciativas inovadoras na área da produção de bens transaccionáveis”.
Ora, um primeiro aspecto desde logo a salientar é que este documento não só não se refere especificamente a nenhum dos grandes projectos em causa como, apesar de se afirmar como “um manifesto com prioridades”, documento apresenta uma lista de áreas em que será possível aumentar a despesa pública sem estabelecer quaisquer prioridades. Ficamos, assim, sem saber se os signatários consideram, por exemplo, as linhas de TGV como prioritárias ou se preferem construir/modernizar escolas, hospitais ou tribunais.
Especialmente curioso é o facto de se referirem a projectos de investimento em infra-estruturas de transporte úteis e de considerarem que “as dúvidas, pertinentes ou não, acerca de alguns grandes projectos podem ser instrumentalizadas”. O que nos pode levar a concluir que os signatários se opõem aos investimentos em infra-estruturas de transporte inúteis e que consideram existir dúvidas pertinentes, pelo menos, relativamente a alguns dos grandes projectos polémicos. Infelizmente, o documento em nada esclarece quais os projectos que consideram (ou não) úteis e relativamente aos quais não há dúvidas e, nessa medida, constitui uma não resposta ao apelo à reavaliação dos grandes projectos de investimento que constitui o ponto essencial do manifesto dos 28.
No que este manifesto se procura distinguir do anterior é na defesa de um aumento da despesa pública e na relevância atribuída aos desequilíbrios externos. No entanto, esta diferença não é tão grande quanto poderá parecer à primeira vista.
Efectivamente, quanto aos desequilíbrios externos é de destacar que o facto de considerarem esses desequilíbrios como um “pretexto” contra o aumento da despesa pública não impede de argumentar que a despesa pública contribui “suportar iniciativas inovadoras na área da produção de bens transaccionáveis” nem de refiram a necessidade de “mecanismos de correcção dos desequilíbrios comerciais sistemáticos de que temos sido vítimas” (infelizmente sem elencar quais), pelo que o documento denota, apesar de tudo, uma natural preocupação com os desequilíbrios externos.
E quanto à política orçamental contra-cíclica o documento refere em numerosas passagens a necessidade de que esse esforço seja coordenado à escala europeia e/ou global. Ora, nesse contexto seria natural que o esforço exigido a cada país tivesse em conta a respectiva situação orçamental e os “desequilíbrios comerciais sistemáticos” e está por demonstrar que a parte do esforço que caberia a Portugal nesse quadro fosse muito superior ao esforço que Portugal apesar de tudo tem vindo já a realizar.

Indicador de sentimento económico

Os indicadores de sentimento económico divulgados pela Comissão Europeia subiram 3,2 pontos na União Europeia (para 71,1) e 3,1 pontos na zona euro (para 73,3), confirmando a tendência para uma redução do ritmo de contracção da actividade económica, sendo de assinalar o facto deste indicador apenas ter caído em 5 Estados-membros (Bulgária, República Checa, Estónia, Letónia e Malta). Para este comportamento positivo contribuíram fundamentalmente a evolução da confiança dos consumidores e nos serviços.
O sentimento económico em Portugal também evoluiu positivamente (+0,5 para 71,4) devido à evolução positiva da confiança dos consumidores (+ 5), na construção (+ 5) e no comércio a retalho (+ 2) que mais que compensaram a quebra de confiança na indústria (-2).