quinta-feira, 30 de setembro de 2010

O pacote de austeridade (II)

Embora não seja um exercício fácil de fazer com base na escassa informação disponibilizada pelo Governo, considerando o conjunto das despesas anunciadas nos três pacotes apresentados ao longo deste ano as medidas de consolidação orçamental previstas terão um efeito incremental em 2011 estimado de cerca de 4,7% do PIB dos quais cerca de 2,4% do PIB correspondente a medidas do lado da receita fiscal e contributiva (1,4% nos PEC I e II e 1,0% no PEC III) e os restantes 2,3% a medidas de redução da despesa orçamental.

Quanto à polémica m torno dos submarinos, confesso que ainda não consegui perceber se vão ser ambos contabilizados em 2010 ou se, como chegou a ser referido, teremos um contabilizado em 2010 e o outro em 2011, o que faz uma diferença significativa quer na avaliação da "real" situação orçamental em 2010 quer no esforço necessário para alcançar os 4,6% em 2011.

No entanto especialmente preocupante é a notícia de que o Governo mantém a previsão de crescimento de 0,5% para 2011. Ora se os números conhecidos para a evolução da economia no primeiro semestre justificam a previsão de crescimento de 1% em 2010 (na verdade pressupõe mesmo um decréscimo do PIB no segundo semestre), o valor projectado para 2011 parece, infelizmente, corresponder a um optimismo injustificado e significa a existência de um risco elevado de não cumprimento das metas em termos de receita e despesas sociais. Adicione-se a isto o ajustamento de 1,6% que será necessário fazer em 2012 e provavelmente teremos daqui a 12 meses o anúncio de um pacote de dimensão semelhante ao que foi ontem apresentado.

A obsessão pelos chamados "grandes projectos de investimento", em especial pelo TGV, em nome da "modernização e do emprego" é absolutamente incompreensível.

Notícias da Irlanda

De acordo com o comunicado do ministro das Finanças da Irlanda o custo com o saneamento do seu sistema bancário corresponderá a cerca de 20% do PIB elevando o défice orçamental deste país para uns estratosféricos 32% do PIB e conduzindo a um aumento da divida pública bruta para cerca de 98,6% do PIB.

Apesar de ter sido reafirmado o compromisso de reduzir o défice para 3% do PIB até 2014, estes dados colocam um sério ponto de interrogação sobre a sustentabilidade das contas públicas irlandesas.

O pacote de austeridade

O pacote de austeridade que o Governo hoje anunciou era em grande medida esperado, na medida em que tinha ficado claro na intervenção que o Ministro das Finanças fez a semana passsada no Parlamento que o cumprimento das metas orçamentais definidas para 2010 e 2011 estava em claro risco e era necessário apresentar medidas que de alguma forma permitissem tranquilizar os mercados quanto à evolução da consolidação orçamental.

O que o Governo nos veio dizer hoje é que para cumprir o objectivo do défice para 2010 vai recorrer a ter de recorrer a medidas excepcionais entre as quais ressalta a transferência das responsabilidades do fundo de pensões da PT que conforme resulta do comunicado da PT à CMVM deverá corresponder a uma receita extraordinária de cerca de 2.600 milhões de euros (equivalente a cerca de 1,5% do PIB) e ainda a um conjunto de outras medidas entre as quais avulta o corte nos abonos de família e a redução das despesas de investimento do Estado (que foram congeladas com efeitos imediatos), o que significa que sem estas medidas adicionais o défice em 2010 provavelmente não andaria muito longe dos 9% do PIB, valor que é consistente com os dados conhecidos da execução orçamental até ao final de Agosto e com os valores das necessidades do SPA ontem divulgados pelo INE.

Quanto a 2010, o Governo apresenta um conjunto de medidas adicionais que no seu conjunto valerão cerca de 3,0% do PIB (ou seja cerca de 5.100 milhões de euros). Infelizmente como os 7,3% serão obtidos à custa de medidas extraordinárias o esforço adicional de consolidação orçamental necessário em 2011 para atingir o objectivo de 4,6% será provavelmente próximo dos 4,5% do PIB (ou seja superior a 7.500 milhões de euros). Valor que numa análise rápida parece corresponder  aproximadamente ao impacto adicional do conjunto incluindo as previstas nos anteriores PEC's eliminando as duplicações.

Sucede, no entanto, que infelizmente as  medidas agora anunciadas terão inevitavelmente um impacto recessivo, parecendo-nos muito muito provável que (à semelhança do que sucedeu na Grécia, Irlanda e Espanha onde foram implementados planos similares) em 2011 se venha a registar um decréscimo do PIB real.

O que a concretizar-se terá efeitos adversos previsiveis quer sobre a receita fiscal quer sobre as despesas sociais que aparentemente seriam dificeis de acomodar e poderão não ter sido tidos em contas. Para ter uma ideia mais correcta dos riscos que poderão estar aqui em causa será no entanto útil esperar pela divulgação do cenário macroeconómico para 2011.

De qualquer modo penso que, muito embora a concretização do objectivo para 2010 vá ser conseguido à custa de receitas extraordinárias, o plano agora anunciado será suficientemente ambicioso para demonstrar a disponibilidade do Governo para tomar as medidas que sejam necessárias e nessa medida deverá permitir aliviar a pressão dos mercados sobre a nossa dívida pública.

PS: De acordo com  as notícias publicadas o custo dos dois submarinos será próximo dos mil milhões de euros, bastante inferior ao valor da receita do Fundo de Pensões da PT. Diga-se ainda que de acordo com o que tinha sido divulgado um dos submarinos seria contabilizado no défice deste ano e outro em 2011.

terça-feira, 28 de setembro de 2010

Contas trimestrais por sector institucional

Os dados hoje divulgados pelo INE revelam que, nos doze meses terminados no final do 2.º trimestre, as necessidades de financiamento da economia portuguesa ascenderam a 9,2% do PIB (isto apesar do comportamento anémico da FBCF que em termos de percentagem do PIB se quedou pelos 19,4%). As necessidades de financiamento da economia correspondem grosso modo às necessidades de financiamento das administrações públicas que no mesmo período ascenderam a cerca de 9,5% do PIB.

O facto das necessidades de financiamento do SPA terem ascendido, no primeiro semestre, a 8.063 milhões de euros (mais 462 milhões do que em 2009), implica que para atingir a meta dos 7,3% de défice será necessário que no segundo semestre as necessidades de financiamento não ultrapassem cerca de 4.400 milhões de euros ou seja menos cerca de 3.600 milhões de euros do que o registado no segundo semestre de 2009 e dá uma ideia da dimensão do esforço de consolidação orçamental que será necessário efectuar nesta segunda metade do ano.

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

As recomendações da OCDE

No fundamental as  recomendações da OCDE hoje divulgadas não trazem absolutamente nada de novo.

Centrando-se na necessidade (diria eu) imperiosa de cumprir os objectivos do chamado PEC II considerando "essencial que as medidas de consolidação orçamental anunciadas sejam implementadas conforme planeado, mesmo que a evolução da conjuntura seja mais adversa do que o esperado" e mesmo que se existirem sinais de tensões no mercado serão necessárias medidas (de austeridade) anunciadas. Aplaudindo o facto de o pacote de consolidação se basear sobretudo na contenção da despesa e considerando que as medidas necessárias do lado da receita devem procurar minimizar os efeitos negativos sobre a economia, centrando-se o aumento dos impostos sobre o consumo (IVA) e sobre a propriedade (o que  não correspondendo às propostas que constam desta publicação) e reduzindo-se a carga fiscal sobre o trabalho.

Ora deve dizer-se que a principal questão que Portugal agora enfrenta e que tem dominado os últimos dias não é a de saber se as metas aprovadas pelo Governo e pela oposição em Maio eram (ou não) adequadas, mas antes o grau de execução dos objectivos então anunciados.

PS: Hoje as taxas de juro da dívida pública portuguesa subiram novamente terminando o dia acima dos 6,40% para as OTs a 10 anos, mas confesso que temia pior.

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Relação entre yield e rácio de cobertura

Um dos factos curiosos dos resultados dos leilões de dívida pública ocorridos não só em Portugal, como também na Irlanda e Grécia, foi a subida das taxas de juro ter sido acompanhada por um elevado volume de procura. O que é tema deste interessante post no blog Alphaville em que além de uma "revisão" da teoria dos leilões se refere que aquele fenómeno poderá estar relacionado com uma elevada dispersão das perspectivas dos agentes face à nossa divida.

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Economia Portuguesa - As últimas décadas


Neste livro, Luciano Amaral descreve de forma sintética os principais traços da evolução da nossa economia nas últimas décadas centrando-se particularmente na evolução ocorrida desde 1974 e em que identifica a alteração do regime cambial ocorrida em 1990-1992, as taxas de juro baixas e a expansão da despesa pública (ininterrupta desde 1974) como as principais causas para o crescimento decepcionante da última década que em conjunto penalizaram o sector transaccionável enquanto que estimulavam o sector não transaccionável conduzindo a uma situação de grave desequilíbrio externo (endividamento), cujas "perspectivas não entusiasmam" e que salvo algum "milagre" ou sobrevivência como região subsidiada (à semelhança da Alemanha de Leste ou do mezzogiorno italiano) parece, segundo o autor, ter como destino mais provável o abandono da UEM ou, em alternativa (ou em conjunto), a declaração de incapacidade de pagamento da dívida externa que conduziria à latino americanização do país.

Independentemente de concordarmos ou não com os cenários traçados (talvez - assim o espero - excessivamente pessimistas) é um livro que merece uma leitura atenta e que para mim vale sobretudo pela discussão que faz no capítulo II sobre o crescimento económico, onde o autor desvaloriza de algum modo a rigidez do mercado de trabalho (que considera mais flexível que  muitos mercados europeus) e a educação (que considera não ser seguro que constitua a receita mágica para o aumento da produtividade) como factores explicativos da fraca produtividade e salienta a importância do fraco crescimento do stock de capital e a baixa produtividade desse mesmo stock de capital.

Resultados do leilão da dívida pública

Os resultados do leilão de OT's hoje realizado em que apesar da opção pela colocação apenas do montante mínimo os yields atingiram os 4,695% a 4 anos e 6,242% a 10 anos são (mais) um sério sinal de aviso das crescentes dificuldades de (re)financiamento da nossa economia (ver aqui). Sendo de notar que estes resultados se seguem aos resultados positivos das emissões ontem efectuadas por Espanha e Irlanda, colocando Portugal numa situação particularmente exposta que torna cada vez mais necessário que o  Governo seja capaz de rapidamente apresentar resultados que tranquilizem "os mercados" relativamente à trajectória das nossas contas públicas.

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Execução Orçamental até Agosto

Os dados divulgados pela DGO relativos à evolução da execução orçamental até Agosto revelam que o défice do subsector Estado nos primeiros 8 meses de 2010 atingiu os 9.189,7 milhões de euros o que representa um acréscimo de 477,1 milhões face ao valor registado em Agosto de 2009.
Deve no entanto, salientar-se que os saldos dos restantes subsctores (Fundos e Serviços Autónomos, Segurança Social e Administração Local e Regional) estão a registar melhorias significativas que permitem compensar aquela deterioração, de modo a que o saldo do conjunto das administrações públicas regista até uma ligeira melhoria de 65,9 milhões de euros. A má notícia é que para este resultado  contribuiu de forma importante a redução dos encargos com juros que se reduziram 290 milhões face ao ano anterior o que significa que o saldo primário se deteriorou em cerca de 224 milhões de euros.

Recorde-se que para que alcançar a meta dos 7,3% do PIB, em 2010 o défice do SPA (que em 2009 ascendeu a 15.543 milhões de euros) não deverá exceder cerca de 12.400 milhões, o que significa a necessidade de uma "poupança" de cerca de 3.100 milhões de euros que parece ser cada vez mais dificil de atingir.

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

A situação financeira

A evolução dos yields da dívida pública portuguesa com a taxa de juro a aproximar-se dos 6% que se aos resultados do leilão de bilhetes de tesouro ontem efectuado constituem sinais bastante preocupantes que colocam Portugal na desconfortável posição de elo mais fraco (a seguir à Grécia) da zona euro (ver aqui). Mesmo e apesar de Roubini ter tido a delicadeza de não mencionar o nosso país neste seu artigo.

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Ainda e sempre o desequilibrio externo

O que mais me preocupa na situação portuguesa é o nível do endividamento e do défice externo. A actual situação ém que a posição líquida face ao exterior corresponde a cerca de 110% do PIB, os passivos face ao resto do mundo cerca de 236% do PIB e o défice da BTC nos últimos doze meses concluidos no final do primeiro trimestre a 9,8% do PIB não é sustentável.

A forma como este profundo desequilíbrio será corrigido corresponde ao alfa e ao ómega da economia porttuguesa e constituirá a principal condicionante para a evolução da nossa economia no médio prazo. E se até aqui tem sido possível, apesar da crise financeira internacional, não só (re)financiar esse endividamento como continuar o processo de acumulação de passivos face ao exterior aproveitando por um lado o crédito do Estado e as facilidades de refinanciamento do BCE, existem sinais cada vez mais preocupantes de que uma e outra fontes de financiamento poderão estar a atingir os seus limites.

Desejavelmente essa correcção deveria ser suficientemente gradual para permitir o ajustamento e a reorientação da actividade económica, aproveitando a progressiva melhoria da conjuntura económica no resto do mundo (e particularmente na Europa) que de algum modo compensasse a necessária redução do peso do consumo privado e da despesa pública na nossa economia. Infelizmente, os sinais positivos no comércio externo parecem ser insuficentes para justificar algum optimismo e embora o cresimento da economia no primeiro semestre do ano tenha siudo positivo o seu perfil assente na procura interna é o oposto daquilo que seria desejável. Refira-se a este respeito que enquanto que, em preços constante, o consumo das famílias e das administrações públicas recuperou para níveis superiores aos registados no terceiro trimestre de 2008 correspondendo respectivamente a 100,5% e 108,6%, o investimento no 2.º trimestre corresponde a apenas 82% (79,9% quando consideramos apenas o investimento em máquinas e equipamentos) e as exportações a 93,4% dos valores então registados.

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Evolução do PIB português no 2.º trimestre

O INE divulgou hoje os dados do PIB  para o 2.º trimestre. Começando pelas boas notícias estes dados indicam que o PIB terá aumentado 1,5% face ao trimestre homólkog e 0,3% face ao trimestre anterior, o que indica que embora a economia esteja a crescer a uma taxa baixa (cerca de 1,1% em ritmo anual no 2.º trimestre) a desaceleração terá sido ligeiramente inferior ao esperado. Com este resultado seria necessário uma quebra do PIB nos próximos dois trimestres para que a taxa de crescimento média anual seja inferior a 1,5%, o que é um valor francamente acima das previsões no final de 2009 e inicio deste ano.

Infelizmente, o perfil do crescimento não parece ser o mais desejável. Com efeito, o motor do crescimento neste trimestre foi aprocura interna que aumentou 0,9% face ao trimestre anterior impulsionada pelo consumo privado de bens duradouros (+2,5%) e sobretudo pelo consumo público que aumentou 3,9% face ao trimestre anterior e 6,2% face ao valor registado no 2.º trimestre de 2009 (que em termos nominais correspondem a aumentos de 3,7% e 6,5%) enquanto a FBCF caiu cerca de 0,7%.  Tendo o contributo da procura externa líquida sico negativo, pois o crescimento das exportações (+4,3%) foi "anulado" pelo crescimento superior da importações (+5,2%) e assitiu-se a uma nova deterioração das necessidades de financianamento no exterior que aumentaram 25,6% face ao trimestre homólogo. Note-se que nos últimos quatro trimestres as necessidades de financimento face ao exterior corresponderam a cerca de 9,1% do PIB.

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Indicadores nos EUA

O ISM para a industria transformadora subiu 0,8 pontos para 56,3, indicando a continuação do aumento da actividade industrial nos EUA. Será contudo de salientar que se registou uma nova redução na componente de novas encomendas que desceu 0,4 pontos para 53,1. Enquanto que o ISM para os serviços caiu 2,8 pontos para 51,5 pontos.

Entretanto, apesar do aumento do emprego a taxa de desemprego em Agosto subiu ligeiramente (para 9,61%) em virtude da subida da taxa de actividade, apontando os dados para que a criação de emprego assalariado no sector privado tenha ascendido a cerca de 54 mil postos de trabalho.

Estes dados parecem confirmar a tendência de desaceleração do crescimento face ao observado no 2.º trimestre.