A subida para 1,5% (+ 25 pontos base) da taxa de juro das operações de refinanciamento decidida na passada quinta-feira que agrava as difficuldades económicas e financeiras do conjunto de países (e.g., Grécia, Irlanda, Espanha e Portugal) em que estão em curso programas de ajustamento económico e orçamental exigentes e com efeitos recessivos importante é bem demonstrativa dos desafios e dificuldades da condução pelo BCE da política monetária no contexto de uma zona euro em que se verifica uma acentuada divergência das condições económico-financeiras entre os países que a integram.
Efectivamente, enquanto que, no seu conjunto, a zona euro registou no primeiro trimestre um crescimento de 0,8% face ao trimestre anterior e 2,5% face ao primeiro trimestre de 2010, este valor resulta da "média" dos crescimentos de vários países que vão dos 4,8% da Alemanha aos -4,8% da Grécia (valores homólogos). Do mesmo modo que a taxa média de desemprego de 9,9% registada em Maio para o conjunto da zona euro "esconde" a diferença entre os 6,0% na Alemanha (onde a taxa de desemprego desceu 1,2 pp no último ano) e os 20,9 verificados em Espanha (onde a taxa de desemprego aumento 0,9 pp desde Maio de 2010) e a taxa de inflação média de 2,7% em Abril oculta as diferenças entre uma subida de preços face ao mês homólogo de 5,5% na Estónia e o aumento de apenas 1,5% na Irlanda.
Ora, numa zona monetária implica que a política monetária deva ser fixada tendo em atenção o conjunto da zona - em que, naturalmente, as maiores economias têm um peso determinante - e a impossibilidade de ajustar as taxas de juro às condições particulares de cada país. O que significa que os países - especialmente os mais pequenos - cujo ciclo económico não esteja sincronizado com a média da zona euro tendem a serem confrontados com políticas monetárias desadequadas relativamente à sua situação concreta. O que sucedeu relativamente aos designdados países da periferia logo após a entrada na zona euro (e.g., Portugal) e durante a maior parte da década de 2000 (especialmente Irlanda e Espanha) em que a política monetária do BCE terá sido exageradamente expansionista para a situação específica destes países e estará agora novamente a ocorrer no actual cenário em que a subida das taxas de juro tenderá a acentuar a recessão associada aos programas em curso de ajustamento orçamental e económico.
Teoricamente, estas diferenças poderiam ser, pelo menos parcialmente, compensadas pela política orçamental. Contudo, na prática tal não funcionou, primeiro porque é politicamente dificil pôr em prática uma política orçamental restritiva numa conjuntura positiva em que as receitas fiscais tendem a aumentar e as despesas sociais a reduzir gerando uma redução do défice (ou até, como sucedeu na Irlanda e Espanha superávites) e agora porque as condições financeiras e orçamentais não só impossibilitam por em prática políticas orçamentais expansionistas como implicam a adopção de medidas de austeridade orçamental, de onde resulta uma tendência para políticas orçamentais pró-ciclicas que amplificam a amplitude do ciclo económico.
Resta, pois, na actual conjuntura o ajustamento "automático" por via das quantidades (aumento do desemprego) ou dos preços e salários (deflação) sendo que quanto maiores os obstáculos à reafectação de recursos e menos flexíveis forem os preços e salários maior tenderá a ser a redução da actividade (maior o aumento do desemprego) necessário para o ajustamento e mais longo este tenderá a ser.
Daí a importância decisiva das ditas reformas estruturais (e a insistência do BCE na sua importância) que visam dotar a economia de uma maior flexibilidade facilitando quer a reafectação de recursos (por exemplo, dos sectores transaccionáveis para os sectores não transaccionáveis) e dos preços e salários para que seja possível recuperar a competitividade com um menor custo em termos de desemprego, tornando o processo de ajustamento menos doloroso.
(Texto publicado originalmente em Letra1)
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