Em carta publicada hoje no Público o coordenador adjunto do Plano Tecnológico vem defender que “O Magalhães vale mais do que dúvidas e polémicas estéreis. O Magalhães vale pelo brilho nos olhos das crianças que o recebem e vale pela oportunidade que lhes é dada de acreditar no futuro e construir algo de novo”.
Fico, pois, feliz por saber para o Governo o mais importante é a felicidade das crianças e que não serão questões ou dúvidas sobre a efectividade dos recursos aplicados ou sobre o financiamento do projecto que vão impedir o Governo de garantir essa felicidade e destruir a esperança no futuro.
É óbvio que em vez de se ter optado por “oferecer” portáteis, poder-se-ia ter recorrido ao testado método utilizado pelo Pai Natal de pedir às criancinhas que formulassem uma lista de desejos com base na qual seria oferecidas “prendas” às crianças. Tal teria eventualmente maximizado a felicidade das crianças mas o Governo também quer que as nossas crianças acreditem no futuro e construam “algo de novo”. E sobre como é que o Magalhães vai contribuir para isso, somos elucidados que “a tecnologia, só por si, não é uma varinha mágica para resolver problemas mas é um fortíssimo catalisador de mudança que ajudará à criação de conteúdos e à participação de muito mais portugueses na rede global”. Ou seja, só por si não, mas talvez combinada com outras coisas o Magalhães possa funcionar uma “varinha mágica” (o que não é de estranhar, pois afinal nas histórias de encantar as varinhas mágicas só funciona quando se conhecem as “palavras mágicas” e “mudança”, “esperança” e “catalisador” são, pelo menos, tão boas como outras quaisquer).
É-nos, no entanto, dito, que o projecto “Vale sobretudo porque coloca o computador e a Internet ao alcance de todas as crianças, e não apenas daquelas cujas famílias podem pagar preços de mercado”. Ou seja, existia uma falha de mercado que impedia que todas as crianças tivessem acesso a computador e à Internet que o Governo se apressou a suprir, mas mesmo aceitando que essa falha existia não se explica porque razão se considerou que esta seria a melhor forma de solucionar essa falha (desde logo não se compreende porquê subsidiar o acesso a todos e não apenas aqueles cujas famílias não podiam pagar o preço de mercado.
E muito francamente duvido que tenha sequer existido uma ponderação adequada dos benefícios, pois o que nos é dito é para não nos preocuparmos pois “o Magalhães não surge em vez de outras coisas que faltam ao sistema de ensino”, ou seja procura-se fazer passar a mensagem de que estaríamos perante o caso raro de “um almoço grátis” e, portanto, não nos precisamos de preocupar com minudências como o custo de oportunidade.
A tranquilidade que esta afirmação me introduz é infelizmente contrariada pela de que “Não há memória de um investimento desta ordem, nem há nenhum pais que tenha feito nada parecido”, pois não havendo custos não sei se podemos falar em “investimento” (ou tem custos elevados e implica necessariamente sacrificios noutras áreas - ou dos contribuintes - ou não tem e o investimento é nulo ou insignificante) e fica porque explicar porque os outros países nunca fizeram nada semelhante… a não ser que o Governo tenha descoberto alguma solução milagrosa, caso em que será de esperar que na próxima reunião da União Europeia a divulgue e depressa veremos surgirem programas semelhantes noutros países da Europa.
PS: Entretanto, na carta afirma-se que “Num mundo que muda à velocidade que tem sido bem evidente nas últimas semanas, é preciso agir no sentido correcto e não encontrar desculpas para ficar parado”, ou seja, parece que se pretende utilizar a actual crise financeira como mais um argumento para justificar este projecto. Curioso para dizer o mínimo.
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