O dia de hoje serviu para demonstrar, aos que eventualmente ainda teriam dúvidas, que a tão propalada "confiança dos mercados" que os mercados tem demonstrado na dívida pública portuguesa assentará quase exclusivamente na ideia de que os nossos parceiros europeus estão disponíveis para nos auxiliar e no "put" (opção de venda) que na prática representam as sucessivas intervenções do BCE adquirindo a nossa dívida nos mercados secundários sempre que as yields começam a subir de forma perigosa.
O dia de hoje foi sobretudo um "teste" dos mercados à disponibilidade e prontidão do BCE para continuar a adquirir dívida portuguesa no mercado secundário, ao qual este respondeu. Sendo curioso de notar que a intervenção terá surgido quando as taxas de juro das yields das OT's a 10 anos estavam no patamar dos 7,6% e as yields das OT's a 5 anos tinham atingido os 6,9%, sendo que ambas fecharam o dia a cair ligeiramente para 7,30% e 6,52%, respectivamente.Enquanto as yields da OT's a 2 anos fecharam com uma ligeira subida face ao dia anterior fixando-se nos 4,45%.
A questão que se coloca é até quando o BCE estará disponível para manter os actuais níveis de apoio à República e ao sistema financeiro português. Pessoalmente, penso que o cenário mais provável é que o BCE manter o apoio até ao reforço e flexibilização do FEEF que deverá ser decidido em Março... a não ser claro que se torne evidente antes dessa data que não será possível o Conselho Europeu chegar a um acordo. Passada essa data, julgo que o cenário mais provável é ficarmos por nossa conta e ou conseguimos recuperar a confiança dos mercados ou seremos mesmo forçados a recorrer ao FEEF.
PS: Concordo com quase tudo o que o Vasco Campilho refere neste post do Albergue Espanhol, no sentido de que o famoso pacto para a competitividade pouco ou nada contribui para a resolução dos problemas fundamentais que a zona euro enfrenta actualmente e que uma solução a prazo deverá passar pelos dois primeiros passos que ele enuncia aqui ou seja por uma reestruturação da dívida dos países em dificuldades financeiras (i.e., Grécia, Irlanda e eventualmente Portugal) e pela recapitalização do sistema bancário, tendo, no entanto, dúvidas quanto à melhor forma de o fazer, nomeadamente quanto a saber se seria politicamente possível a criação de um fundo europeu para esse efeito. Não tenho nada de fundamental a opor ao 5.º passo, mas penso que politicamente será dificil alcançar o reforço do orçamento comunitário aí referido e não me parece que seja essencial no imediato. E sinceramente tenho dúvidas quanto à bondade quer dos Eurobonds quer de mecanismos de sanções automáticas quer ainda quanto à praticabilidade e eficácia do controlo dos desequilibrios macroeconómicos.
2 comentários:
Caro JP Santos, obrigado pelo comentário sobre os 5 passos.
Quanto à exequibilidade política de alguns pontos que defendo, estou bem consciente de que a Europa está longe de os aprovar. Mas há coisas que ninguém sonhava há dois anos e agora estão a acontecer... Se de facto formos para a reestruturação das dívidas - e o BCE opõe-se a ela com unhas e dentes - não vejo como se poderá evitar um esforço público de recapitalização do sistema bancário, e dificilmente esse esforço poderá ter sucesso se feito a nível nacional.
Quanto a Eurobonds e um PEC com sanções automáticas, não vejo que haja outra forma de assegurar a estabilidade da zona monetária que na ausência de um orçamento central muito maior do que o actual (não falo de 2% do PIB mas de 20%). Mas o debate sobre estes temas vai vivo, e se há coisa que não falta à Europa é imaginação...
"não vejo como se poderá evitar um esforço público de recapitalização do sistema bancário, e dificilmente esse esforço poderá ter sucesso se feito a nível nacional"
Para mim esta é a grande interrogação. A solução irlandesa foi esse esforço ser feito a nível nacional com fundos europeus, o que na prática consistiu em transferir um montante elevadissimo de responsabilidades do sector financeiro para o sector público, naquela que terá sido uma das maiores transferências de riqueza da história com consequências que conhecemos sobre a estabilidade das finanças públicas. As alternativas a essa solução são fazer com que os credores dos bancos suportem esses custos ou fazer uma partilha desses custos por todos os Estados-membros. Qualquer destas soluções tem riscos económico-financeiros e políticos óbvios.
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