quinta-feira, 31 de março de 2011

Comunicado do IGCP

O IGCP informou hoje que "devido a procura específica neste título, o IGCP irá realizar um leilão extraordinário da OT 5% Junho 2012 amanhã de manhã, das 9:15 horas até às 9:30 horas. O montante indicativo é de EUR 1500 milhões" (meu sublinhado).

Trata-se de uma emissão a pouco mais de um ano, mas mesmo assim, ão deixa de ser surpreendente este anúncio dado o ambiente de hoje nos mercados. A ser bem sucedida esta operação será uma boa notícia que deverá permitir refrear os receios de um recurso imediato ao FMI / FEEF... pelo menos até à semana seguinte para a qual o IGCP anunciou um leilão de bilhetes do tesouro.

PS: Uma possível explicação para a "procura específica" daquele título pode ser o facto de as yields da dívida pública portuguesa nos prazo mais curtos estar acima da dívida irlandesa o que pode ser identificado pelos "especuladores" como uma oportunidade de arbitragem.

Resultados dos testes de stress na Irlanda

Os testes de stress aos bancos irlandeses apontam para que as necessidades de reforço de capital ascendam a 24 mil milhões de euros (ver página 12 do relatório), valor que corresponde a cerca de 15,6% do PIB da Irlanda em 2010.

Numa leitura rápida, saliento que o grau de desalavancagem previsto (ver página 13) é impressionante correspondendo a uma contracção dos empréstimos liquidos de 255,6 mil milhões de euros para 185,2 mil milhões de euros (ou seja um redução de 27,5%) e a dimensão das perdas por imparidade nos créditos que no cenário base correspondem a cerca de 27,5 mil milhões de euros e no cenário de stress a 40,1 mil milhões de euros (ver página 19).

A reacção dos mercados

A reacção dos mercados ao anúncio está a ser bastante eloquente, há minutos as taxas eram as seguintes:
2 anos - 8,639% (+0,609 pp); 3 anos - 9,212% (+0,522 pp); 5 anos - 9,581% (+0,449 pp) e 10 anos - 8,342% (+0,241 pp).

Não vale sequer a pena tentar esconder a realidade os números de hoje são não só muito piores do que aqueles com os quais o Governo se tinha comprometido como são também piores do que aqueles que vinham sendo "antecipados" na comunicação social: i) o défice de 2010 foi de 8,6% quando se "falava" num valor de 8%; ii) a revisão dos valores do défice para 2007 e 2008 implicam que 2010 foi o sexto ano consecutivo em que o défice ficou acima dos 3%; e, iii) o aumento da dívida pública superior a 9 pontos percentuais.

Neste contexto, tentar argumentar que se trata de um efeito "contabilístico" pode ser eficaz para consumo político interno, mas apenas contribui para aumentar a desconfiança dos mercados e vir dizer que "Este Governo não tem legitimidade nem condições para negociar seja o que for", mesmo que seja verdade, apenas serve para aumentar mais a incerteza dos investidores.

Procedimento de défices excessivos 2011 indica que o défice público foi de 8,6%

O INE divulgou os valores da notificação ao Eurostat dos valores do défice e da dívida pública para efeitos do Procedimento de Défices Excessivos de 2011 e o que se pode dizer é que os números são (significativamente) piores do que aquilo que vinha sendo antecipado, indicando que o défice das administrações públicas no ano de 2010 foi de  14.911,6 milhões de euros que corresponde a 8,6% do PIB ou seja 1,3 pontos percentuais acima do famoso objectivo dos 7,3% com que o Governo se havia comprometido.

Para este resultado contribuiu a inclusão das empresas de transporte: REFER, Metropolitano de Lisboa e Metro do Porto que tiveram um impacto no défice de 2010 de 793 milhões de euros (cerca de 0,5% do PIB) enquanto que o impacto do BPN  e das garantias do BPP ascendeu a 2.250 milhões de euros (cerca de 1,3% do PIB).

De referir ainda que em consequência da reclassificação daquelas empresas de transporte os valores dos défices de 2007 a 2009 foram revistos em alta correspondendo, de acordo com os dados agora divulgados a (valores em percentagem do PIB) 3,1% em 2007, 3,5% em 2008 e 10,0% em 2009.

Igualmente importante e não deixará certamente de ter um impacto significativo nos mercados é o efeito da inclusão daquelas empresas no rácio de dívida bruta. Os valores agora apresentados para a dívida das administrações públicas indicam que no final de 2010 a dívida pública ascendia a 159.469,1 milhões de euros que corresponde a 92,4% do PIB o que representa um aumento de 9,5 pontos percentuais face ao valor de 2009 e uma subida de 9,1 pontos percentuais relativamente ao valor previsto na notificação enviada ao Eurostat no Outono do ano passado.

Economia e Moral

Na apresentação do novo livro de Vitor Bento "Economia, Moral e Política" as intervenções, especialmente a do autor, versaram sobretudo sobre o tema da relação entre a Economia e a moral e a ligação das teorias económicas à moralidade social que definiu como o conjunto de valores que uma sociedade valoriza e os incentivos (ou penalizações) que atribui para orientar os comportamentos para esses valores e que o autor considerou constituir uma "função de restrição" que condiciona o comportamento (maximizador) dos agentes e assim determina os resultados económicos.

Não foi tão evidenciado na apresentação, mas resulta claro da primeira parte do livro (que já pude ler), que os próprios princípios éticos do indívíduo podem desempenhar um papel idêntico, ou o que conduzirá a um resultado semelhante serem incorporados nas "funções de utilidade" dos indivíduos. E, por outro lado, a influência que a própria teoria económica e em particular as hipóteses de que os objectivos dos agentes consistem na maximização do seu bem-estar material ou, no caso das empresas, do lucro podem ter na própria formação da moral social e individual levando-as a adoptar aqueles objectivos como "valores" em si mesmos.

Uma demonstração interessante da influência da moralidade sobre os comportamentos "económicos" são as experiências relatadas por Dan Ariely (e que aparecem referidas num livro de que recentemente falei aqui) de que o autor nos fala no final da primeira parte do livro e que revelam a influência das âncoras valorativas e do exemplo sobre os comportamentos económicos. 

Uma excepção rara e notável

Depois do meu próprio recente post sobre um artigo de Greenspan não resisti a colocar um link para este post que glosa com a uma frase proferida por Greenspan:

Today’s competitive markets, whether we seek to recognise it or not, are driven by an international version of Adam Smith’s “invisible hand” that is unredeemably opaque. With notably rare exceptions (2008, for example), the global “invisible hand” has created relatively stable exchange rates, interest rates, prices, and wage rates.
Recomendo que não percam a caixa de comentários, com (algumas) excelentes variações sobre o tema, sendo que a minha preferida é:

Pompeii has always been a safe place to raise a family, except on those notably rare exceptions when Vesuvius erupts.
PS: Quem ainda não estiver cansado pode ver outra lista de "variações" aqui.

quarta-feira, 30 de março de 2011

Evolução do indicador de sentimento económico

Os dados hoje divulgados pela Comissão Europeia revelam uma estabilização do sentimento económico na União Europeia (aumento de +0,2 pontos para 107,4) e um ligeiro decréscimo no conjunto da zona euro (-0,6 pontos para 107,3) sendo este comportamento divergente resultado do decréscimo deste indicador na Alemanha (-0,7 pontos para 116,1) e do acréscimo no Reino Unido (+2,7 pontos para 104,6).  Nas outras duas principais economias verificou-se um aumento de 0,9 pontos (patra 110,0 pontos) em França e de 0,1 pontos (para 101,2) em Itália.

Estes dados apontam para uma continuação da recuperação da actividade económica na Europa no seu conjunto, enqaunto se acentuou ligeiramente a divergência entre a situação conjuntural nos países do centro e norte da Europa - e.g., Bélgica, Dinamarca, Alemanha, França, Países Baixos, Áustria, Finlândia e Suécia - onde o indicador se situa em níveis claramente superiores à média histórica de 100 pontos e os países periféricos do sul da Europa - Espanha, Portugal e Grécia (mais uma vez não existem dados para a Irlanda) - onde o indicador se situa significativamente abaixo desse limiar e voltou a cair: -1,0 pontos (para 78,4) na Grécia, -3 pontos (para 90,9) em Espanha e - 6 pontos (para 88,7) em Portugal, países que são conjuntamente com o Chipre (85,3 pontos) aqueles onde este indicador apresenta os valores mais baixos.

Porque descem os ratings da República Portuguesa

Vale a pena ler as razões para a descida do rating da República Portuguesa apresentadas pela Standard & Poors (via Zerohedge) - os sublinhados são meus:

• The concluding statement of the European Council meeting of March 24-25, 2011, addressing the terms under which EU sovereigns may borrow from the European Stability Mechanism (ESM) confirms our previously published expectations that (i) sovereign debt restructuring is a potential pre-condition to borrowing from the ESM, and (ii) senior unsecured government debt will be subordinated to ESM loans.
Both features are, in our view, detrimental to the commercial creditors of EU sovereign ESM borrowers, and represent a major departure from the current European Financial Stability Facility (EFSF) regime whereby sovereign EFSF loans rank pari passu with a borrowing sovereign's commercial debt.
Given Portugal's weakened capital market access and its likely considerable external financing needs in the next few years, it is our view that Portugal will likely access the EFSF and thereafter the ESM.
• While we believe Portugal's public sector debt trajectory could start to decline in 2013, thereby creating the possibility that Portugal may be able to obtain ESM funding without being required to restructure its debt (based in part upon our reading of the "sustainable path" language in the EC's concluding statement), the issue of subordination remains.
• We are therefore lowering our sovereign credit ratings on Portugal to 'BBB-/A-3'.
• The negative outlook reflects our view that the macroeconomic environment could weaken beyond our current expectations and that a political impasse could undermine the effective implementation of Portugal's adjustment program, leading to non-negligible policy slippages.

ou seja, a S&P não só considera bastante provável que Portugal tenha de aceder à ajuda externa como pensa que essa ajuda se deverá prolongar para lá de 2013 altura em que o EFSF será susbstituído pelo ESM e a principal razão para a descida do rating para BBB- prende-se com os receios de reestruturação da dívida portuguesa que derivam, por um lado da eventual exigência dessa reestruturação para aceder ao futuro mecanismo e, por outro lado, de mesmo que tal não seja o caso os créditos que venham a ser concedidos via ESM terem preferência sobre os créditos pré-existentes o que implica um aumento do risco de crédito para os investidores privados.

Já agora saliento o que a S&P refere na parte final do texto, onde se diz que: "Portugal still faces sizable twin deficits and their reduction will stress policymakers' resolve in the face of what we believe will become an increasingly hostile public opinion. Risks of a challenging economic and financial environment could negatively affect asset quality and profitability in the Portuguese financial system, potentially triggering the need for capital support from the government" (meu sublinhado).

terça-feira, 29 de março de 2011

As "projecções" do Banco de Portugal para a economia portuguesa

As projecções do Boletim de Primavera do Banco de Portugal apontam para um recuo do PIB de 1,4% em 2011 e um aumento do PIB de 0,3% em 2012. O que significa que as projecções se mantêm praticamente inalteradas face às divulgadas no Boletim de Inverno onde se apontava para uma evolução do PIB de -1,3% em 2011 e 0,6% em 2012.

Note-se, no entanto, que o Banco de Portugal adverte que "os resultados das projeções agora publicados apenas consideram as medidas orçamentais bem especificadas e já aprovadas, designadamente no âmbito do Orçamento de Estado para 2011. Neste contexto, importa sublinhar que a evolução orçamental subjacente ao presente exercício não reflete todas as medidas necessárias ao cumprimento dos exigentes objetivos orçamentais assumidos pelo Estado português para 2011 e, em particular, para 2012. Em 2011 persistem riscos de implementação não negligenciáveis que decorrem, inter alia, do grau de consolidação orçamental numa magnitude sem precedente. Em 2012, o conjunto de medidas adicionais de caráter permanente necessárias para alcançar o objetivo assumido pelas autoridades atinge uma dimensão muito substancial. A adoção dessas medidas implica uma nova contração significativa da atividade económica, à semelhança do projetado para 2011." (meu sublinhado) O que, traduzindo, significa que a queda do produto em 2011 será superior à agora projectada e que em 2012 teremos uma recessão  novamente uma queda do PIB.
Mais, o Banco de Portugal refere, ainda, que "a atual projeção não considera ainda o inevitável processo de desalavancagem do setor privado, incluindo do sistema bancário" (meu sublinhado).

Ou seja, por mau que o cenário possa parecer a realidade será certamente significativamente pior...

PS: Note-se, ainda, que de acordo com as "projecções" agora avançadas o défice da balança corrente e de capital mantém-se acima dos 8% do PIB em 2011 e 2012. O que representa, aliás, uma deterioração face aos valores do Boletim de Inverno que reflecte "não só o expressivo aumento do preço das matérias-primas energéticas, como também um crescimento robusto do preço das matérias-primas não energéticas e dos preços dos bens manufaturados" como o alargamento do défice da balança de rendimentos "refletindo a deterioração continuada da posição de investimento internacional e a subida dos custos de financiamento".

E de quem é a "culpa" das subidas anteriores

Hoje as taxas de juro da dívida pública voltaram a iniciar o dia a subir e as yields das OT's a 5 anos já vão nos 8,74%... não que isso interesse muito. As taxas de juro no mercado secundário já ultrapassaram claramente os níveis que tornam a nossa dívida insustentável pelo que mais ou menos uns pontos base não fazem qualquer diferença na avaliação da situação do país e, salvo milagre, não nos restará outra solução além de recorrer ao "auxílio" do  FMI / FEEF.

Neste contexto, o Governo tem vindo a atribuir  as responsabilidades pelo recente aumento das taxas de juro à "crise política" provocada pelo chumbo do PEC IV. Ora, deve dizer-se que esta veio aumentar os níveis de incerteza quanto à existência de condições políticas para implementar as medidas de austeridade indispensáveis para garantir a sustentabilidade da dívida, se é sempre dificil determinar com um grau de rigor mínimo qual a parte do aumento recente das taxas de juro que se deve a um facto, o fluxo de notícias e informações do últimos dias torna impossível qualquer exercício objectivo nesse sentido.

De qualquer modo como podemos facilmente constatar (aqui) a verdade é as taxas de juro da dívida portuguesa a 5 anos têm vindo a subir de forma continuada desde inícios de Fevereiro, devendo notar-se que esse movimento contrasta com a tendência de (ligeira) descida da dívida pública espanhola (ver aqui) o que aponta para uma explicação relacionada com factores específicos da situação portuguesa mesmo antes da "crise política".

segunda-feira, 28 de março de 2011

Quando tudo corre mal

Num dia em que a S&P voltou a reduzir o rating dos bancos portugueses, a derrota da CDU da Sra. Merkel nas eleições de Baden-Wurtenburg, em que o "ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações não quis (...) confirmar nem desmentir o valor de 12 mil milhões de euros referidos pelo Eurostat como devendo constar no valor do défice de 2010 relativo ao passivo das empresas públicas de transportes" (meu sublinhado), se fala de um "novo" buraco de 23 mil milhões de euros nas contas dos bancos irlandeses e o presidente do BCE veio novamente advertir contra os riscos inflaccionistas há poucos minutos os yields da dívida pública eram os seguintes:  2 anos: 7,396%; 3 anos: 8,265%; 5 anos: 8,696%; 7 anos: 8,225% e 10 anos: 7,931%... sem que houvesse sinais de intervenção do BCE que parece definitivamente ter-nos abandonado à sorte dos mercados.

A arte do possível

Seguindo a comunicação social parece que existem, por um lado, os portugueses que querem recorrer ao auxílio extermo e os que recusam esse auxílio.

Ora devo dizer que pessoalmente não me enquadro em nenhuma dessas categorias. Pertenço à certamente esmagadora maioria que preferia, sem qualquer dúvida, que Portugal não não tivesse que recorrer à ajuda financeira. Infelizmente entre aquilo que seriam as nossas preferências e aquilo que é possível vai muitas vezes uma distância demasiado grande...  Não tenho qualquer problema em admitir que, nos últimos meses, o Governo tem feito um esforço enorme para evitar essa solução, mas a verdade é que só tem sido possível adiar o recurso ao auxilio externo graças à apoio do BCE e que multiplicam-se os sinais de que estamos perigosamente perto do momento em que a República portuguesa deixará de ser capaz de (re)-financiar a sua dívida no mercado, por inexistência de compradores disponíveis, caso em que a alternativa de não recorrer ao FMI será o caos económico e financeiro.

domingo, 27 de março de 2011

Sobre o artigo "Activismo" de Alan Greenspan

O recente "artigo" do ex-presidente da Reserva Federal intitulado "Activism" parece ter sido escrito de propósito para justificar o recente comentário de Krugman de que "if you’ve reached the point where you don’t pay attention to anything that might disturb your orthodoxy, you’re not doing science, you’re not even pursuing a discipline. All you’re doing is perpetuating a smug, closed-minded sect."

No seu comentário que foi objecto de grande divulgação mediática para grande agrado da direita conservadora americana Greenspan defende que o "activismo" estatal que está a impedir aquilo que de outro modo seria uma recuperação robusta da actividade da economia dos EUA.

Para fundamentar a esta conclusão Greenspan invoca o resultado de regressões entre o "capex ratio" (que corresponde ao rácio entre o investimento em activos ilíquidos de longo prazo e o cash-flow líquido das empresas) e o rácio de utilização da capacidade produtiva e o défice do orçamento federal ajustado do ciclo. De acordo com os resultados obtidos, Greenspan chega à conclusão que cerca de 26% da variação do capex ratio pode ser "explicada" pelo nível de utilização da capacidade produtiva, enquanto que o défice do orçamento federal "explica" cerca de 18% daquela variação.

Mas, não contente com este facto avança para uma "conclusão" ainda mais bombástica de que entre metade e dois terços da evolução do "capex ratio" será devida ao activismo do Estado. Ora, julgo que vale a pena reproduzir o argumento nas próprias palavras utilizadas por Greenspan (não só para não correr o risco de poderem pensar que o estou a interpretar erradamente mas sobretudo porque acho o raciocínio simplesmente delicioso): "The 0.26 of capex variation attributed to the operating rate is clearly not a function of activism. But none of the remaining three quarters can be so readily dismissed. Corporate executives, in large majorities, identify their current pronounced caution as driven by aversion to activism, a view consistent with their current behaviour that has parallels with the 1930s. The Great Depression was far more devastating than the current crisis. Nonetheless, the parallels between the degree of business angst in those years and today’s capex ratio is supportive of the presumption that ‘activism’ is a likely explanation of the 0.55 unexplained variation in shortfalls in capex, especially in the post-crisis years." (meu sublinhado) daqui inferindo que no mínimo metade, e possivelmente, até três quartos da aversão à iliquidez que justificará a "surpreendente" tepidez da recuperação económica dos EUA resulta das incertezas criadas pelo aumento do activismo do Estado ocorrido desde o colapso da Lehman & Brothers.

Ora se é muito discutível que a regressão entre o "capex ratio" e o défice orçamental ajustado do ciclo permita concluir que quase 20% da variação daquela variável é explicada pela variação do défice orçamental a atribuição da totalidade (ou quase) da variação não explicada pleo nível de utilização da capacidade produtiva ao "activismo estatal" resulta apenas de uma profissão de fé que Greenspan candidamente não hesita em confessar ao referir que "Those of us who see competitive markets, with rare exceptions, as largely self-correcting are most leery of government intervening on an ongoing basis. The churning of markets, a key characteristic of ‘creative destruction’, is evidence not of chaos, but of the allocation of a nation’s savings to investment in the most productively efficient assets – a necessary condition of rising productivity and standards of living". E não negando que, raras por vezes, assim não suceda porque "human nature being what it is, markets often also reflect these fears and exuberances that are not anchored to reality (...) the presumption that intervention can substitute for market flaws, engendered by the foibles of human nature, is itself highly doubtful. Much intervention turns out to hobble markets rather than enhancing them".

E, portanto, o melhor que o Estado tem (deve) fazer é abster-se de intervir para não perturbar o de outro modo inelutável regresso da economia a uma situação de "equilíbrio" de pleno emprego. Neste contexto teórico pré-keynesiano, os mercados garantem sempre, por definição, a recuperação do pleno emprego e a única que poderá impedir esse resultado serão obstáculos ao "livre" funcionamento dos mercados.

Claro que para a "narrativa" ser consistente é ainda necessário explicar o mecanismo pelo qual o activismo estatal perturba os mercados, nomeadamente, nos períodos (como o da grande depressão dos anos 30 e o actual) em que o desemprego é extremamente elevado e, portanto, o efeito clássico de "crowding out" será teoricamente pouco significativo. Embora não desista completamente do argumento do crowding out (invocando, nomeadamente,  a subida das taxas de juro das obrigações com ratings mais baixos, relativamente às quais reconhece, em nota de rodapé que "Contrary to expectations [sic], the cost of capital, whether interest cost (BBB bond yields) or cost of equity (equity premiums), does not help to explain the variations in the capex ratio"), para ultrapassar este "pequeno" obstáculo neste artigo Greenspan justifica o efeito do maior activismo através do aumento da "incerteza" considerando que a intervenção do Estado constitui uma "important economic variable contributing to such heightened risk aversion", referindo mesmo que "unpredictable discretionary government intervention scrambles the prospective underlying supply–demand balance. Speculators, who might add support to a market when it is weakest and hence when their buying is most risky, lose their perspective and withdraw to the sidelines. The mere uncertainty of when, and to what extent, government might intervene raises risk enough to thwart much desirable speculative support for markets".

Isto obviamente que está nos antípodas daquilo que se deveria designar por "ciência", mas é revelador de uma  forma infelizmente muito comum de encarar a macroeconomia, que também afecta muitos "keynesianos", em que, tal como acontecia com o sistema ptolomeico antes da revolução de Copérnico e Galileu, os factos são incapazes de resistir a um "bom" modelo teórico.

sábado, 26 de março de 2011

Um país desatento

A dificil situação financeira do Sector Empresarial do Estado não devia ser novidade para ninguém, os números estão disponíveis para quem os quiser analisar no site da Direcção-Geral do Tesouro e Finanças (ver aqui) e de acordo com o relatório do 3.º trimestre de 2010, apontam para um passivo global (incluindo Parpública, Saúde e Estradas de Portugal) de cerca de 32,6 mil milhões de euros (valor que corresponde a cerca de 19% do PIB).

E há pouco de mais de um ano foi conhecido um estudo do BPI sobre a sustentabilidade das contas públicas (que comentamos aqui) que ilustrava a importância dos compromissos assumidos pelo estado no âmbito do Sector Empresarial do estado (SEE), fazendo um excelente trabalho de identificação das diferentes situações, e das concessões de serviço público, nomeadamente através das Parcerias Público-Privadas (PPP) e que apontava para que para que a dívida pública consolidada do Estado correspondesse já no final de 2009 a 100% do PIB. Valor que como indicámos na altura correspondia a uma estimativa conservadora.

Ora, os valores dos compromissos assumidos através do SEE apenas eram "sustentáveis" graças à garantia do Estado pelo que a descida do rating do Estado tem reflexos imediatos sobre a capacidade de (re)financiamento desses compromissos e nas actuais circunstâncias, como aliás tem sido notado nas análises das agências de rating. O que pode obrigar a um saneamento financeiro dessas empresas numa altura muito pouco conveniente, gerando uma situação similar à que ocorreu na Grécia e na Irlanda onde o reconhecimento das responsabilidades com as empresas públicas e o sector bancário vieram agravar (ainda mais) o défice.

sexta-feira, 25 de março de 2011

Com a corda na garganta

De acordo com as análises  do Royal Bank of Scotland (que tem sido divulgadas via Alphaville) o montante do pacote de ajuda de que Portugal necessita deverá rondar os 80 mil milhões de euros (valor muito próximo dos 75 mil milhões referidos pelo Presidente do Eurogrupo). Também de acordo com o RBS Portugal precisa de (pelo menos ?) mais mil milhões de euros em Abril e terá apenas duas opções para obter esse financiamento:
- emitir títulos que sejam adquiridos pelo sistema bancário português com fundos cedidos pelo BCE ou
- através de empréstimos provisórios cedidos pelo FMI / FEEF.
Se a primeira opção deve deasagradar ao BCE a segunda pode ser dificultada pela ausência de autoridade política para negociar um acordo.
Passado o mês de Abril, de acordo com o mesmo quadro, o serviço de dívida da República Portuguesa em Maio e Junho ascende a 2 mil milhões de euros de juros e 7  mil milhões (juros e reembolso), respectivamente...

Não será certamente por coincidência que (mais uma vez via Alphaville) o Nomura considera para efeitos de "modelização" que o pedido de auxílio irá ocorrer no 2.º trimestre de 2011 ou seja até ao final de Junho.

Taxas de juro seguem em alta

Depois das descidas de rating da República anunciadas pela Fitch e pela Standard & Poors os yields da dívida pública seguem em alta com os referentes à dívida atingido os valores de 7,04%, 8,03%, 8,45% e 7,78%, nos prazos de 2 anos, 3 anos5 anos e 10 anos, respectivamente.

Alguém ainda acredita que é possível evitar o recurso ao FMI / FEEF ?

quinta-feira, 24 de março de 2011

A reacção dos mercados

Dadas as notícias da demissão do Governo após o chumbo do pacote de medidas de austeridade (que levaram a um corte do rating pela Fitch) e as dificuldades da União Europeia em concluir o acordo sobre os mecanismos de auxílio financairo, a verdade é que a subida das taxas de juro da dívida pública portuguesa acabou por ser relativamente moderada.

Mas não tenhamos ilusões com os actuais níveis de taxa de juro (que nos 5 anos subiu para valores superiores a 8,2%) o recurso ao auxílio externo é inevitável e a subida só não foi muito maior porque o mercado já estava a "descontar" que essa ajuda iria ocorrer.

terça-feira, 22 de março de 2011

Isto é muito preocupante

O Jornal de Negócios noticia hoje que a CP não está a conseguir financiar-se no mercado, o que não constituirá propriamente uma grande surpresa. Mas, ainda, mais grave e preocupante é a referencia a que "Além dos 630 milhões de euros que precisava durante este ano, a CP tem de obter mais 120 milhões de euros nos próximos quatro meses, para liquidar antecipadamente um empréstimo que fez no mercado de capitais internacional. A amortização desta dívida deveria ocorrer em 2021, mas segundo sabe o Negócios, com a descida de "rating" da empresa a CP vai ter de amortizar antecipadamente esse empréstimo."

Na actual situação financeira o (re)financiamento destes compromissos terá quase inevitavelmente de ser assumido pelo Estado colocando uma ainda pressão sobre o défice e/ou a dívida pública, tornando ainda mais dificil uma situação já de si insustentável e cada vez mais evidente a inevitabilidade do pedido de auxílio externo.

Programa de Estabilidade e Crescimento 2011-2014

O Programa de Estabilidade e Crescimento para 2011-2014 hoje apresentado no Parlamento prevê para 2011 uma queda do PIB de 0,9% provocada por uma queda de todas as componentes da procura interna (consumo privado: -1,1%; consumo público: -6,8% e investimento: -4,2%), parcialmente compensada pela evolução positiva das exportações (+5,6%) e das importações (-1,1%) e uma redução do emprego de 0,6% que elevará a taxa de desemprego média para 11,2%. Para os anos seguintes prevê-se uma taxa de crescimento de somente 0,3%, 0,7% e 1,3%  e um aumento do emprego de 0,1%, 0,7% e 1,0%. Valores que implicam um aumento da produtividade muito baixo. Enquanto que a FBCF deverá continuar a cair embora a um ritmo mais moderado em 2012 e 2013, apenas subindo ligeiramente em 2014.

No que se refere ao cenário macroeconómico refira-se ainda que apesar deste comportamento as necessidades de financiamento face ao exterior manter-se-ão em valores muito elevados (8,3%, em 2011, 7,0%, em 2012, 5,8%, em 2013, e 4,9% em 2014), valores superiores ao crescimento do PIB e que implicam uma continuação da deterioração da posição de investimento internacional.

segunda-feira, 21 de março de 2011

A inflação na China

A nível global um dos temas mais importantes dos últimos meses tem sido a discussão em torno da evolução da inflação nas economias emergentes e, em particular, na China onde a taxa de inflação regstou uma subida ao longo de 2010 situando-se em Fevereiro nos 4,9% e relativamente à qual têm surgido várias notícias dando contas de uma pressão altista sobre os salários.

Ora embora esta situação possa obrigar a que as autoridades chinesas tenham de restringir a política monetária e orçamental, como têm começado a fazer, para reduzir a procura e, assim, conter as tensões inflacionistas o que pode ter um efieto negativo sobre o produto mundial, por outro lado, estas tensões tornam mais fácil que a China aceite uma valorização gradual do yuan que tem sido reclamada como uma das medidas necessárias para ajudar a solucionar os desequilibrios macroeconómicos globais. Não será, no entanto, de esperar que essa valorização, por si só, seja suficiente para resolver qualquer dos problemas na medida em que, por um lado, uma valorização forte do yuan podia colocar em risco sectores importantes da sua indústria exportadora e, por outro lado, o efeito dessa alorização sobre a inflação na China seria relativamente limitado.

No entanto, o próprio efeito da inflação tenderá a contribuir para esse reequilíbrio, na medida em que no cenário actual de inflação relativamente baixa nos EUA e na Europa corresponde a uma revalorização real do yuan que, associada a uma subida dos níveis salarias na China, impulsionará o consumo interno e ajudará a redireccionar a economia chinesa para o mercado interno para satisfazer essa mesma procura.

Neste contexto, uma subida moderada da inflação na China é um desenvolvimento positivo para a sustentabilidade da situação da economia mundial.

sábado, 19 de março de 2011

Breve comentário sobre o cenário dos testes de stress

De acordo com a informação disponibilizada pela EBA, os testes de stress que serão publicados em Junho do corrente de ano, serão conduzidos tendo por base os dados de balanço consolidados com referência a 31 de Dezembro de 2010 e a aplicação dos cenários por um período de 2 anos (2011 e 2012) e visam estimar os efeitos ddas variáveis macroeconómicas - PIB, desemprego, taxas de juro, preço do imobiliário, evolução do mercado de acções e das taxas de câmbio - sobre o capital dos bancos, partindo de um cenário base que está em linha com aquelas que são as previsões da Comissão Europeia (para a zona euro: crescimento de 1,5% em 2011 e 1,8% em 2012, redução gradual dos défices públicos e do desemprego e inflação média de 1,75%), sobre o qual se aplicam choques externos que se traduzem num "cenário adverso" hipotético.

Deve-se dizer que o "cenário adverso" é bastante exigente correspondendo, por exemplo, para Portugal a um cenário hipotético de redução do PIB de 3% em 2011 e 2,6% em 2019, uma taxa de desemprego de 12,9% no final de 2012, taxa de juro de longo prazo acima dos 9% em ambos os anos e uma queda dos preços do imobiliário (residencial) de 2,9% em 2011 e 8,4% em 2012 e uma queda das cotações em bolsa de cerca de 15%. Sendo certo que é sempre possível imaginar situações em que estas variáveis poderão assumir valores ainda mais adversos parece-me um cenário razoavelmente pessimista para os efeitos pretendidos.

A grande questão dos resultados de stress e a razão pelo qual os mesmos dificilmente serão considerados como satisfatórios por muitos investidores não serão pois tanto os cenários considerados, mas o que não é testado. Com efeito, nos testes em causa não será explicitamente analisado o risco de liquidez - que muitos apontam como um elemento crucial - e, sobretudo, os efeitos da "crise da dívida soberana" apenas são tidos em conta relativamente aos títulos detidos na carteira de negociação e não nos títulos detidos até à maturidade, o que sendo consistente com a hipótese de que não haverá reestruturação da dívida não deixará de ser criticado por muitos analistas numa altura em que se fala cada vez com mais insistência numa reestruturação da dívida pública grega.

sexta-feira, 18 de março de 2011

O cenário para os testes de stress

A Autoridade Bancária Europeia publicou hoje os detalhes do cenário para os testes de stress do sistema bancário e a respectiva metodologia.

quinta-feira, 17 de março de 2011

Presos por arames

De acordo com o Diário Económico o Ministro da Presidência declarou na Assembleia da República que
uma crise política neste momento "Constitui uma ameaça para uma rutura quase imediata da capacidade de financiamento do Estado Português. Isto tem consequências na capacidade do Estado em conseguir honrar os seus compromissos financeiros, para que o sistema financeiro consiga mostrar-se sólido e para que as empresas consigam ter acesso ao crédito, manter a sua actividade e manter o emprego dos trabalhadores" (meu sublinhado) referindo ainda que "Está em causa a proteção social do Estado" e que "Quem provocar uma crise política num momento como este, desfazendo todo o esforço de construção de confiança que resulta do trabalho dos portugueses e das diligências que o Governo tem feito junto das instituições europeias, será responsável pelas consequências dessa crise política".

Deixando de lado a leitura política destas declarações (ver aqui e aqui) não faz sentido apregoar que se está a "construir a confiança" e a seguir dizer que se houver crise política será o caos... ou será que pensam que os "mercados" não lêem jornais.

Em segundo lugar, para os "mercados" e agências de rating é absolutamente indiferente quem Governa desde que as medidas de consolidação sejam tomadas e implementadas. Ora, nada nos leva a concluir que um Governo PSD se revelasse menos empenhado em tomar as medidas necessárias para garantir os objectivos do défice e pelas declarações dos seus responsáveis nos últimos dias parece-me seguro concluir que o PS mesmo na oposição não deixará de, em nome do interesse nacional, apoiar as medidas que um Governo PSD viesse a apresentar e, portanto, não haveria nenhuma razão para temer a hipótese de eleições antecipadas.

Pelo que, ou tudo não passa de encenação ou, estas declarações apenas revelam que infelizmente os esforços do Governo para construir a "confiança" não estarão a ser muito bem sucedidos... e que "estamos presos por arames".

quarta-feira, 16 de março de 2011

A importância da situação dos bancos portugueses

Contrariamente ao que vai sucedendo por cá, onde estranhamente a questão tem passado quase despercebida, a situação dos bancos portugueses e em particular as referências à necessidade de recapitalização parecem começar a merecer a atenção dos observadores internacionais como resulta deste post hoje publicado no Alphaville eloquentemente intitulado "Portugal: finally about the banks", onde se cita um comentário que refere:
Increasing focus on Portuguese banks’ funding. Portuguese banks still have €42b funding from the ECB, down only 18% from the peak, and still very large given their relative size. By contrast, Spain’s ECB financing has fallen from €130bn last July to €49bn now.
The Portuguese Government has given an April 30 deadline to the banks to strengthen their capital. It seems increasingly likely that they will fail to do so, and the Government will eventually end up having to provide capital. This might trigger the Sovereign bailout.
Não tenho quaisquer dados que me permitam concluir quais poderão ser os valores envolvidos e desconheço se os bancos estarão, ou não, (espero que sim) em condições de encontrar fontes de financiamento privadas que lhes permitam fazer face às necessidades de aumento de capital que eventualmente venham a ser detectadas... mas a mera possibilidade de virem a necessitar de fundos públicos é assustadora.

Resultados do leilão de Bilhetes do Tesouro

De acordo com os resultados divulgados pelo IGCP, o Estado português conseguiu colocar o montante máximo pretendido (mil milhões de euros) com um rácio bid to cover bastante confortável de 2,2 a uma taxa de juro média ponderada foi de 4,331% (a taxa mínima 4,1% e a máxima 4,4%).

Estes resultados indicam que, pelo menos por enquanto, o mercado continua a revelar "apetite" pela dívida pública portuguesa, pelo menos de curto prazo, mas apenas a taxas de juro cada vez mais elevadas.

Comunicado da Reserva Federal

No seu comunicado de ontem a Reserva Federal indica que a recuperação económica nos EUA parece estar a consolidar-se e que as condições do mercado de trabalho tem vindo a registar uma melhoria gradual.

Apesar disso e do efeito da subida dos preços das matérias primas sobre a inflação, a Reserva Federal considera que a expectativas de inflação no longo prazo permancem num nível baixo e que o desemprego permanece a um nível muito elevado, tendo mantido a sua taxa de juro entre 0 e 0,25% e continuando a antecipar que as condições económicas provavelmente conduzirão a que venha a manter esta taxa de referência em níveis muito baixos durante um período prolongado.

terça-feira, 15 de março de 2011

Moody's desce o rating de Portugal

A agência de rating Moody's desceu o rating de Portugal de A1 para A3, mantendo o outlook negativo, justificando esta medida com base em quatro factores (informação obtida via Alphaville):

"1. Subdued growth prospects and productivity gains over the near to medium term until structural reforms, especially in the labor market and the justice system, begin to bear fruit;
2. Implementation risks for the government’s ambitious fiscal consolidation targets;
3. The government’s balance sheet may need to expand further in the event it has to provide financial support to the banking sector and government-related institutions (GRIs), which are currently unable to access capital markets; and
4. Challenging market conditions that have led to increases in the government’s financing costs, which, if sustained, will cause its debt affordability to weaken, particularly in the context of generally higher European interest rates. Accessing the European Financial Stability Facility may lead to a reduction in financing costs, but questions would remain as to when the government would be able to re-access the capital markets and on what terms." (meu sublinhado)

PS: Algo que me tem sinceramente surpreendido é o silêncio de (quase) todos os comentadores sobre as várias referências à situação do sistema financeiro português.

Sobre as decisões da cimeira da eurozona

É o tema de um artigo de Daniel Gros (publicado no Vox) no qual considera que estas decisões foram mais um passo para uma partilha pelos contribuintes europeus dos encargos com a dívida grega, chamando a atenção para a reestruturação que resulta de facto do alargamento da maturidade e da descida das taxas de juro dos empréstimos concedidos à Grécia e pondo em causa os cálculos do FMI/União Europeia e Banco Central Europeu relativos à sustentabilidade da dívida grega.

Igualmente interessante é a sua posição relativamente à possibilidade de o FEEF adquirir dívida pública no mercado primário, relativamente ao que refere que: "It is difficult to see the difference between primary market purchases of government bonds and providing credit directly to a country. This part of the agreement will be of limited value unless the condition (EFSF programme) is relaxed, as it well might be in future."

Nikkei caíu 10,55%

A situação alarmante das centrais nucleares de Fukushima levou a uma queda de 10,55% do índice Nikkei, elevando-se a 17,53% a queda registada face aos valores de fecho de 10 de Março de 2011, com reflexos nos outros mercados asiáticos e está a gerar fundadas preocupações sobre as possíveis consequências que poderá acarretar para a recuperação económica global.

segunda-feira, 14 de março de 2011

A "vitória" de Portugal

Infelizmente não consegui encontrar tradução, mas fica aqui o texto integral da declaração conjunta do Banco Central Europeu e da Comissão Europeia que o primeiro-ministro qualificou como uma “ vitória importante” obtida por Portugal na cimeira da zona Euro que se realizou na passada sexta-feira (os sublinhados são meus):

The Portuguese authorities have formulated in a "Note on policy guidelines and measures that the Portuguese Government will adopt to address main economic challenges" an ambitious policy response to proceed with fiscal consolidation, address structural problems and strengthen the financial system.

■ On fiscal policy, the announced measures underline the government commitment to achieving the fiscal targets of a general government deficit of 4.6 percent of GDP in 2011, 3 percent in 2012, and 2 percent in 2013. The 2011 budget already contained substantial structural consolidation measures of 5 percent of GDP for 2011. Estimates had shown that under cautious macroeconomic assumptions a fiscal gap of ¾ percent of GDP remained. For 2012 and 2013, the gaps based on unchanged policies amounted to 2¾ and 1 percent of GDP respectively. With today’s announcement, the Portuguese authorities have committed to an additional substantial package of measures which will allow to achieve the fiscal targets.

The Portuguese authorities also commit to addressing the existing vulnerabilities in the financial system. They acknowledge the need for a reduction in the funding gap of the banking system through appropriate de-leveraging. The need for strengthening bank capital is also acknowledged and banks will be required to submit to Banco de Portugal individual plans specifying timelines and pace of appropriate de-leveraging and capital reinforcement. These plans shall be assessed by the ECB and the European Commission, in line with respective competencies. Recapitalisation needs, based on rigorous and timely stress tests, are to be communicated as soon as possible to ensure that the recapitalisation needs of the Portuguese banks are being appropriately addressed.

■ In order to raise the growth potential and overall flexibility of the Portuguese economy, the government has committed to a far-reaching structural reform agenda which addresses growth bottlenecks and structural rigidities. The commitment to concrete dates of the reform in many areas is especially welcome.

■ Regarding labour market reforms, the actions announced are reducing distortions and segmentation in the labour market. Further concrete measures would be conducive to raising potential output growth. The Portuguese government has rightly identified the inefficiencies in the judicial system as an important impediment to economic activity and is committed to implement substantial reforms. The announced measures to improve the enforcement of competition rules should contribute to a more competitive environment. Reforming the housing market as announced has the potential of significant positive effects both on activity and labour mobility, while limiting household indebtedness. In addition, the government has committed to further reform efforts in the area of energy, transport and services sectors.

We welcome and support the announced policy package. The authorities should address any need for further specification of measures, most notably with respect to labour markets, in the context of the National Reform and Stability Programmes to be presented in April. The present momentum should be maintained and the Portuguese authorities should ensure full implementation of all measures. The policy follow-up will be closely monitored by the European Commission, in liaison with the ECB, in the context of enhanced surveillance.
Perante este texto ou o primeiro-ministro não leu a declaração ou é incapaz de distinguir uma "vitória" de um "violento puxão de orelhas".

Reacção dos mercados

As medidas de austeridade anunciadas na sexta-feira e o acordo de princípio obtido pelos líderes dos países da zona euro estão a conduzir a um alívio significativo das taxas de juro da dívida pública portuguesa, em todos os prazos mas particular nos prazos de 23 e 5 anos, que se matém todavia em níveis claramente acima dos 6%, no primeiro caso, e dos 7% nos outros prazos. Ou seja, apesar destes sinais positivos estamos longe de uma "normalização" destas taxas de juro que permanecem em níveis claramente insustentáveis.

Para esta redução dos juros da dívida pública parece estar sobretudo a contribuir a possibilidade de que o FEEF venha a adquirir directamente dívida pública dos países limitando os custos de (re)financiamento da dívida pública. O que apenas seria possível num quadro de forte condicionalidade e dá credibilidade às notícias que apontam para que existirá já um plano de apoio à economia portuguesa pronto a ser accionado.

domingo, 13 de março de 2011

Evolução do PIB no 4.º trimestre de 2010

Os dados do PIB divulgados pelo INE na passada sexta-feira confirmaram que o volume do PIB no 4.º trimestre de 2010 terá decrescido 0,3% face ao trimestre anterior.

Para esta evolução negativa contribuiram a evolução da formação bruta de capital fixo que caiu 2,5% face ao 3.º trimestre registando o valor, em volume, mais baixo desde o 4.º trimestre de 1996 e a procura externa (as exportações reduziram-se em 1,1% e as importações aumentaram 1,3%. Enquanto que em sentido contrário as desepsas de consumo que aumentaram 1,2% impulsionadas por um forte crescimento das despesas de consumo das administrações públicas (+4,6%) enquanto que as despesas de consumo das famílias cresceram apenas 0,1% uma vez que o  forte crescimento do consumo das famílias em bens duradouros (+10,6%) foi "anulado" pela redução do coinsumo em bens não duradouros e serviços.

Refira-se, ainda, que no conjunto de 2010 as necessidades de financiamento líquidas da economia portuguesa  ascenderam a 8,4% do PIB, o que embora represente uma evolução positiva face aos valores registados nos anos anteriores (9,8% em 2009 e 11,0% em 2008) constitui ainda um valor claramene insustentável.

sábado, 12 de março de 2011

O Comunicado conjunto do BCE e da Comissão Europeia

O comunicado do BCE não podia ser mais transparente nas razões da inevitabilidade do conjunto de medidas ontem anunciadas. Ao referir que "Estimates had shown that under cautious macroeconomic assumptions a fiscal gap of ¾ percent of GDP remained. For 2012 and 2013, the gaps based on unchanged policies amounted to 2¾ and 1 percent of GDP respectively. With today’s announcement, the Portuguese authorities have committed to an additional substantial package of measures which will allow to achieve the fiscal targets." Ou seja, sem as medidas agora anunciadas, o BCE e a Comissão Europeia consideraram, e o Governo português aceitou, não só não seria possível atingir os objectivos para o défice em 2012 e 2013, o que já se sabia, como o défice em 2011 se situaria não nos 4,6% mas sim em valores próximos dos 5,4%. O que sendo politicamente relevante não constitui propriamente uma grande surpresa.

Já o segundo ponto do comunicado do BCE é muito mais preocupante. Pois nele se refere que as autoridades portuguesas reconheceram "the need for a reduction in the funding gap of the banking system through appropriate de-leveraging" e que "The need for strengthening bank capital is also acknowledged and banks will be required to submit to Banco de Portugal individual plans specifying timelines and pace of appropriate de-leveraging and capital reinforcement. These plans shall be assessed by the ECB and the European Commission, in line with respective competencies. Recapitalisation needs, based on rigorous and timely stress tests, are to be communicated as soon as possible to ensure that the recapitalisation needs of the Portuguese banks are being appropriately addressed." Colocando em termos muito claros aquilo que referi ontem a  propósito das medidas anunciadas.

Após esta declaração, que certamente não deixará de ser lida com muita atenção pelos "mercados", já que pode implicar um esforço financeiro que Portugal não estará neste momento em condições de efectuar sem ajuda externa, colocando ainda mais incerteza quanto à sustentabilidade da dívida pública portuguesa parece-me muito dificil que consigamos continuar a obter financiamento no mercado e cada vez mais inevitável o recurso ao auxílio financeiro externo.

Pacto de "competitividade"

Os países da zona euro chegaram a um acordo de princípio sobre o pacto dito de "competitividade" que envolverá ter elementos:
- inscrição nas constituições ou legislação nacional de limites para a dívida e défice públicos;
- aumento da capacidade de financiamento efectiva do FEEF para 440 mil milhões de euros (actualmente seria de 250 mil milhões de euros), o que implica um aumento das garantias concedidas pelos Estados-Membros;
- flexibilização das regras de utilização para permitir que o FEEF possa adquirir dívida pública.

Aparentemente a primeira medida limitar-se-à a transpor para a legislação nacional dos países da zona euro aquilo que já resulta dos instrumentos comunitários e tem um efeito será meramente simbólico. O aumento da capacidade efectiva de financiamento do FEEF destina-se claramente a assegurar os mercados de que existirão os fundos suficientes caso seja necessário um auxílio financeiro a Espanha e era já há muito dado como garantido. Pelo que a grande novidade deste plano será a flexibilização das regras de utilização do FEEF permitindo que o mesmo possa adquirir dívida pública, o que pode ter um efeito importante, nomeadamente para Portugal, sobre o mercado, nomeadamente ao permitir que o FEEF substitua o papel que tem vindo a ser desempenhado pelo BCE na contenção da subida das taxas de juro da dívida pública. Desconhecem-se contudo as condições em que o FEEF poderá comprar dívida pública, bem como os montante que poderão estar em causa, pelo que é neste momento impossível avaliar o impacto que esta medida poderá vir a ter.

sexta-feira, 11 de março de 2011

O PEC IV

O Ministro das Finanças apresentou medidas adicionais para este ano e um conjunto de medidas para 2012 e 2013, que contudo não parecem estar a impressionar os mercados, onde as taxas de juro continuam a subir com as yields das OTs a 5 anos a aproximarem-se dos 8%.

O documento contém uma referência importante à "preparação, até final de Abril de 2011, de planos de reorganização em cada banco, com calendários e metas relativos à dimensão e composição do balanço, estrutura de capital e eficiência operacional, consistentes com o ajustamento macroeconómico e o processo de consolidação orçamental. O intuito será reforçar rapidamente a base de capital dos bancos, sobretudo atendendo à necessidade de desalavancagem e de recuperação do acesso aos mercados. Estes planos serão avaliados pelo Banco de Portugal até o final de Maio de 2011". Ora, a incerteza quanto aos montantes que poderão estar envolvidos parece incompatível com a necessidade de assegurar o acesso ao mercado para financiamento da República até final de Abril a taxas que não sejam proibitivas.

Quem avisa amigo é ?

De acordo com o Diário Económico: em entrevista ao Financial Times, o ministro das Finanças austríaco, Joseph Proell, expõe esta inquietação. "O meu sinal para Portugal é que olhe para a Grécia e Irlanda: não se atrasem. Tomem a vossa decisão rapidamente: sim ou não", frisa. "Se os números concretos em Portugal dizem que não conseguem refinanciar o País nos próximos anos sem ajuda, devem aproveitar rapidamente a vantagem da protecção [do fundo de resgate]. Mas não podemos forçá-los, essa é a realidade".

Sejamos claros os "mercados" consideram que existe uma elevada probabilidade de Portugal vir a ser forçado a renegociar a dívida no médio prazo e as taxas de juro que cobram são claramente insustentáveis, reforçando esse cenário e afectando não só o financiamento do Estado como o do resto da economia.

Infelizmente a crise financeira que atravessamos afecta não apenas o Estado mas também o sector privado. E - como a Grécia e Irlanda demonstram - o recurso ao FEEF não será por si só suficiente para restaurar a capacidade de (re)financiamento do sistema bancário - que irá portanto continuar a depender do apoio do BCE ou de um esforço de recpaitalização - que esperemos seja possível efectuar sem recurso a fundos públicos. Mas, se formos incapazes de nos financiarmos no exterior isso implica um ajustamento brutal do défice externo que apenas pode ser obtido através de uma contracção quase sem precedentes da procura interna que, sem o instrumento cambial, as exportações apenas poderão compensar muito parcialmente colocando a economia em riscos de entrar numa espiral descendente extremamente perigosa.

quinta-feira, 10 de março de 2011

Não é apenas coincidência...

Estava a ler este interessante discurso de Janet Yellen da Reserva Federal sobre o sistema monetário financeiro internacional onde defende uma evolução para um "international monetary system characterized by more-flexible exchange rates, open capital accounts, and independent monetary policies that will facilitate the adjustment of global imbalances" ao mesmo tempo que reconhece que "For countries [China] with undervalued currencies, the adoption of more-flexible exchange rates requires an internal shift in resources across sectors--a transition that takes time", e não pude deixar de notar que algumas das frases sobre a crise financeira internacional:

"I would apportion responsibility to inadequacies in both the monetary and financial systems. With respect to the international monetary system, the basic story is now quite familiar: Strong capital outflows from countries with chronic current account surpluses--in part reflecting heavily managed exchange rates, reserve accumulation, and other shortcomings in the operation of the international monetary system--put downward pressure on real interest rates, in turn boosting asset prices (particularly for housing) and enhancing the availability of credit. These developments contributed significantly to the buildup of financial imbalances, but they were not, on their own, sufficient to have engendered the massive financial crisis we experienced.
Had the additional domestic credit associated with these capital inflows been used effectively, the imbalances need not have led to financial ruin. In the United States and other countries with current account deficits, however, borrowing too often supported excessive spending on housing and consumption, rather than financing productive investment (...)"
poderiam, com algumas pequenas alterações, ser utilizadas para descrever o que se passou em Portugal desde a segunda metade da década de 90. E não é apenas coincidência.

O custo da recapitalização da banca espanhola

O Banco de Espanha divulgou hoje os resultados dos seus cálculos sobre as necessidades de capital dos bancos espanhóis, tendo concluído que 12 bbancos terão de aumentar o seu capital num total de € 15,15 mil milhões de euros. Valor muito abaixo do estimado pela agência de rating Moody's (ver aqui via Alphaville)que considera que o montante necessário deverá situar-se próximo dos 40 a 50 mil milhões de euros e que caso a situação se deteriore poderá mesmo vir a aumentar para 110 a 120 mil milhões de euros, o que corresponderia a cerca de 10 8 vezes as estimativas agora divulgadas pelo Banco de Espanha.

Estertor final ?

As taxas de juro da dívida pública portuguesa no mercado secundário estão a "explodir" nos prazos mais curtos. Há momentos o yield das OT's a 2 anos estava nos 6,29% (+1,599 pontos percentuais), as OT's a 3 anos situavam-se nos 7,21% (+0,961 pp) e as OT's a 5 anos iam nos 7,72% (+0,082 pp) !!!  Enquanto as OT's a 10 anos desciam 0,142 pp para 7,49%.

Aparentemente o mercado está convencido de que as decisões que a UE tomar nos próximos dias 11 e 24 e 25 de Março não serão suficientes para resolver os problemas de financiamento de Portugal enquanto que crescem os receios de que seja necessária uma recapitalização dos bancos portugueses (ver por exemplo aqui) num dia em que a Moody desceu o rating da dívida espanhola precisamente com base numa estimativa sobre as necessidades de capital do sector financeiro espanhol .

Uma crise forte e prolongada

Independentemente do juízo de valor político sobre o discurso de tomada de posse do Presidente a verdade é que não vi até agora ninguém contrariar de forma convincente o pesado diagnóstico da situação económica, finanaceira e social que Portugal atravessa. Independentemente da retórica política, Portugal teve nos últimos 10 anos um crescimento medíocre, um défice externo anual próximo dos 9% do PIB que conduziu a uma posição de investimento internacional (endividamento líquido face ao exterior) que ultrapassa os 100% do PIB, uma redução da poupança nacional de cerca de 20% para 10%, uma redução da taxa de investimento, um défice público elevado e enfrenta uma crise de financiamento externo que afecta não só o Estado mas também o sistema bancário e o conjunto da economia portuguesa e uma taxa de desemprego próxima dos 11%.

Estamos pois perante um cenário de crise relativamente em que teremos de efectuar um dificilimo ajustamento dos défices público e externo. Num contexto de fortre contracção orçamental, de dificuldades de acesso ao crédito e de elevados níveis de endividamento das famílias e empresas, o único caminho para o crescimento passa pela "aposta" nas exportações.

Na ausência do instrumento cambial que permitiria, através da desvalorização, obter ganhos rápidos de competitividade externa e, via inflação, reduzir o endividamento real do sector privado, o cenário mais provável parece ser o de uma recessão severa e prolongada não parecendo provável que "batamos no fundo" antes de finais da segunda metade de 2012 a que se seguirá provavelmente um recuperação lenta com o desemprego a permanecer em níveis (demasiado) elevados durante alguns anos.

Não tenhamos ilusões, salvo um milagre (em que sinceramente não acredito), mesmo com uma evolução favorável das condições de auxílio externo no seio da União Europeia os próximos anos serão certamente (muito) dificeis em termos económicos e sociais. Mas, as opções políticas e estratégicas que tomarmos poderão mitigar ou acentuar os sacríficios e sobretudo irão condicionar de forma decisiva a evolução do potencial de crescimento da economia portuguesa nas próximas décadas. 

É por isso com desgosto que vejo que os comentários sobre o discurso do Presidente em vez de se centrarem no essencial e na discussão da estratégia para o futuro não consigam escapar à armadilha do argumento "ad hominen" e da análise fundada no taticismo político. Assim não vamos lá !

quarta-feira, 9 de março de 2011

Resultados do leilão de OT

A boa notícia é que apesar de um contexto bastante adverso a República Portuguesa conseguiu colocar, na emissão de hoje, o montante máximo (mil milhões de euros).

Infelizmente, quer a taxa a que foram colocadas (taxa média ponderada de 5,993% e taxa de corte de 6,046%) quer o rácio entre a procura e o montante colocado (1,6) não são de molde a deixar-nos tranquilos relativamente às emissões futuras.

terça-feira, 8 de março de 2011

Previsivelmente Irracional - Dan Ariely


É um livro muito interessante para todos os que tenham curiosidade pelo ramo da economia comportamental, no qual Dan Ariely, baseando-se num conjunto de trabalhos de pesquisa conduzidos pelo autor ao longo dos anos, demonstra como as nossas decisões são condicionadas pelas nossas emoções, expectativas e normas sociais que nos levam a cometer "erros" sistemáticos, afastando-nos do padrão tradicional do homo economicus hiper-racional.

De forma intelectualmente estimulante, o autor procura tirar dessas experiências algumas lições gerias sobre a forma como pensamos e tomamos as nossas decisões e as respectivas implicações no mundo empresarial e na vida política, bem como ajudar-nos a reconhecer os nossos erros e a tomar melhores decisões não só financeiras mas também na nossa vida pessoal.

Alerto, no entanto, para três aspectos. Em primeiro lugar, embora demonstrando convincentementeque somos menos racionais do que aquilo que a teoria económica geralmente assume, o livro não nos conduz à conclusão de que as nossas decisões são basicamente irracionais, não sendo essa, aliás, a posição do autor que a este respeito refere no prefácio que "Apesar do deslumbramento pela capacidade humana ser inteiramente justificado, existe uma grande diferença entre um sentimento profundo de admiração e a suposição de que temos um raciocínio perfeito". Não se trata, pois, ao contrário do que o título pode levar a supor, de um livro sobre a irracionalidade mas antes sobre a distância que nos separa da racionalidade perfeita e que surge, na esteira dos trabalhos de Herbert Simon (nobel em 1978) e Daniel Kahneman (nobel em 2002), sobre a racionalidade limitada. O que significa que em muitas situações a hipótese de racionalidade perfeita pode (continuar a) ser considerada como uma aproximação perfeitamente razoável na modelização do comportamento económico. Em segundo lugar, que sendo um dos ensinamentos do livro a influência do contexto e das expectativas sobre as decisões é relativamente arriscado extrapolar os resultados das experiências para outras situações e que devemos ter presente a crítica de Lucas. Finalmente, um aspecto que me parece importante é a forma como a concorrência entre empresas pode (ou não) contribuir para que as soluções de mercado não se afastem demasiado dos previstos pela microeconomia clássica.

segunda-feira, 7 de março de 2011

Yield das OT's a 5 anos

O yield das OT's a 5 anos estava há momentos nos 7,57%, ultrapassando o yield das OT's a 10 anos.E isto no dia em que foi noticiado que a dependência dos bancos portugueses face ao financiamento do BCE voltou a aumentar no mês de Fevereiro.

ISM e evolução do emprego nos EUA

O indicador de sentimento na indústria dos EUA subiu uma vez mais no mês de Fevereiro (+ 0,6 pontos para 61,4) o que indica a continuação de um cresimento robusto da produção industrial neste país (em Janeiro a produção da indústria transformadora foi 6% superior à verificada no mês homólogo e a taxa de crescimento anualizada no meses Nov-Jan face ao trimestre anterior situou-se nos 5,5%), sendo de assinalar a evolução positiva das componentes novas encomendas (68,0 pontos confirmando a forte subida do mês anterior), do emprego (+2,8 pontos para 64,5) e stocks que indicam que estes estão num nível baixo e que deverão sustentar a evolução deste sector nos próximos meses.

Os sinais mais positivos para a economia estado-unidense vieram no entanto dos dados do emprego em Fevereiro que apontam para uma descida da taxa de desemprego para 8,9% (depois de 21 meses acima dos 9%) e para uma aceleração da criação de postos de trabalho, expressa pelo aumento do emprego no sector privado (excluindo a agricultura) de 222 mil empregos. Note-se no entanto que apesar da redução de 190 mil desempregados o número de desempregados é ainda superior em mais de 6 milhões face ao que se registava em finais de 2007, período em que a taxa de desemprego nos se encontrava em redor dos 5%.

domingo, 6 de março de 2011

A dificil situação do Sector Empresarial do Estado

O corte dos ratings da Parpública, Refer, CP e Metro. O que irá certamente tornar ainda mais complicado  o financiamento destas empresas num contexto que já era dificil como demonstrado pelo recente falhanço da Refer em colocar dívida no montante de 500 milhões de euros e numa altura em que os bancos portugueses continuam a sentir enormes dificuldades para se financiar nos mercados internacionais.

sexta-feira, 4 de março de 2011

As declarações de Trichet

Após quase uma semana em viagem e com acesso limitado à internet com reflexos na periodicidade dos posts (mas que permitiu pôr em dia um conjunto de leituras interessantes), o facto económico mais relevante e de algum modo surpreendente são as declarações do presidente BCE de ontem, assinalando a possibilidade de uma subida das taxas de juro já na próxima reunião quando tudo apontava para que tal apenas viesse a verificar-se no 3.º trimestre, com efeitos na valorização do euro e nas taxas euribor.

O que sendo de algum modo consistente com a evolução positiva da actividade económica (sobretudo, como temos vindo a assinalar nos países do centro e norte da Europa) e com a evolução da inflação relativamente à qual nos comentários de Trichet se refere que embora resulte sobretudo dos aumentos dos preços dos produtois petrolíferos e bens alimentares "is also discernible in the earlier stages of the production process. It is paramount that the rise in HICP inflation does not lead to second-round effects and thereby give rise to broad-based inflationary pressures over the medium term. Inflation expectations over the medium to longer term must remain firmly anchored in line with the Governing Council’s aim of maintaining inflation rates below, but close to, 2% over the medium term". O que atendendo ao nível anormalmente baixo a que as taxas de juro é visto pelo BCE como aconselhando a uma subida das taxas de juro que tenha um efeito preventivo sobre a inflação impedindo que esta se consolide.

Dito isto deve salientar-se que uma pequena subida das taxas de juro da zona euro (e.g., de 0,25 pp) não terá provavelmente qualquer efeito perceptível sobre o nível de inflação na medida em que não é crível que reverta os principais factores que estão na base da sua subida e que estão, sobretudo, relacionados com factores de ordem política e pela evolução da procura dos países emergentes (não sendo por acaso que o FMI já começou a chamar a atenção para os riscos de "sobreaquecimento" de algumas dessas economias), arriscando a credibilidade do BCE, enquanto que por outro lado, um aumento significativo da taxa de juro pode colocar sérios riscos à recuperação económica da zona euro, risco que o BCE não parece querer correr. Colocado nesta posição dificil o BCE parece ter optado pela estratégia de aumentar um pouco a taxa de juro, esperando que isso seja suficiente para evitar que a inflação continue a subir e assim evitar mais tarde subidas mais elevadas.

Um outro aspecto que este anúncio vem salientar é a dificuldade de conduzir uma política monetária num contexto em que as situações económicas dos diferentes países que integram essa zona monetária são bastante distintas. Com efeito, se a evolução da conjuntura económica da maior parte dos países europeus parece permitir acomodar sem grandes receios uma pequena subida das taxas de juro, tal subida não poderia vir em pior altura para os países periféricos, como é o caso de Portugal, forçados a proceder em 2011 e 2012 um ajustamento orçamental muito dificil e que sofrem os efeitos da deterioração dos termos de troca associados ao aumento dos preços do petróleo e bens alimentares.